segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Morfologia- Questões discursivas com gabarito comentado




1. (Unicamp 2012)  Há notícias que são de interesse público e há notícias que são de interesse do público. Se a celebridade "x" está saindo com o ator "y", isso não tem nenhum interesse público. Mas, dependendo de quem sejam "x" e "y", é de enorme interesse do público, ou de um certo público (numeroso), pelo menos.
As decisões do Banco Central para conter a inflação têm óbvio interesse público. Mas quase não despertam interesse, a não ser dos entendidos.
O jornalismo transita entre essas duas exigências, desafiado a atender às demandas de uma sociedade ao mesmo tempo massificada e segmentada, de um leitor que gravita cada vez mais apenas em torno de seus interesses particulares.

(Fernando Barros e Silva, O jornalista e o assassino. Folha de São Paulo (versão on line), 18/04/2011. Acessado em 20/12/2011.)

a) A palavra público é empregada no texto ora como substantivo, ora como adjetivo. Exemplifique cada um desses empregos com passagens do próprio texto e apresente o critério que você utilizou para fazer a distinção.
b) Qual é, no texto, a diferença entre o que é chamado de interesse público e o que é chamado de interesse do público?


Resposta:

a) Na frase “Há notícias que são de interesse público e há notícias que são de interesse do público”, a palavra “público” é usada na primeira ocorrência como adjetivo, relacionado com o substantivo “interesse”, e na segunda como substantivo inserido na locução adjetiva “do público”.
b) O autor usa a expressão “interesse público” para designar toda a coletividade a quem a notícia deve interessar e “interesse do público” com valor restritivo, referindo-se a determinados setores sociais propensos à informação de massa, divulgada em grande escala pela mídia atual.



  
2. (Unicamp 2012)  Os verbetes apresentados em (II) a seguir trazem significados possíveis para algumas palavras que ocorrem no texto intitulado Bicho Gramático, apresentado em (I).

I

Bicho gramático

Vicente Matheus (1908-1997) foi um dos personagens mais controversos do futebol brasileiro. Esteve à frente do paulista Corinthians em várias ocasiões entre 1959 e 1990. Voluntarioso e falastrão, o uso que fazia da língua portuguesa nem sempre era aquele reconhecido pelos livros. Uma vez, querendo deixar bem claro que o craque do Timão não seria vendido ou emprestado para outro clube, afirmou que “o Sócrates é invendável e imprestável”. Em outro momento, exaltando a versatilidade dos atletas, criou uma pérola da linguística e da zoologia: “Jogador tem que ser completo como o pato, que é um bicho aquático e gramático”.

(Adaptado de Revista de História da Biblioteca Nacional, jul. 2011, p. 85.)

II

Invendável: que não se pode vender ou que não se vende com facilidade.
Imprestável: que não tem serventia; inútil.
Aquático: que vive na água ou à sua superfície.
Gramático: que ou o que apresenta melhor rendimento nas corridas em pista de grama (diz-se de cavalo).

(Dicionário HOUAISS (versão digital on line), houaiss.uol.com.br)

a) Descreva o processo de formação das palavras invendável e imprestável e justifique a afirmação segundo a qual o uso que Vicente Matheus fazia da língua portuguesa “nem sempre era aquele reconhecido pelos livros”.
b) Explique por que o texto destaca que Vicente Matheus “criou uma pérola da linguística e da zoologia”.


Resposta:

a) Tanto o termo “invendável” quanto “imprestável” apresenta o prefixo “in” que agrega valor significativo de negação aos adjetivos vendável e prestável. Vicente Matheus queria dizer que Sócrates não era passível de ser emprestável, ou seja, seria “inemprestável”, mas usou inadequadamente o termo “imprestável” que significa inútil, que não tem serventia.
b) O termo “pérola” designa popular e ironicamente um dito ou um fato um tanto ou quanto tolo, quer pelo conteúdo, quer pela forma como é dito. Ao usar o termo “aquático”, Vicente Matheus associou um jogador de futebol a um animal anfíbio (“pérola da zoologia”), além de lhe conferir características de filólogo, pela relação quase imediata da palavra “gramático” com o estudioso da língua (“pérola da linguística”).



  
3. (Unb 2012)  O emplasto

Um dia de manhã, estando a passear na chácara, 3pendurou-se-me uma ideia no trapézio que eu tinha no cérebro.

Uma vez pendurada, entrou a bracejar, a pernear, a fazer as mais 1arrojadas cambalhotas. Eu deixei-me estar a contemplá-la. Súbito, deu um grande salto, estendeu os braços e as pernas, 4até tomar a forma de um X: decifra-me ou devoro-te.

Essa ideia era nada menos que a invenção de um medicamento sublime, um emplasto anti-hipocondríaco, destinado a aliviar a nossa melancólica humanidade.

6Na petição de privilégio que então redigi, chamei a atenção do governo para esse resultado, verdadeiramente cristão. Todavia, não neguei aos amigos as vantagens pecuniárias que deviam resultar da distribuição de um produto de tamanhos e tão profundos efeitos. Agora, porém, que estou cá do outro lado da vida, posso confessar 7tudo: o que me influiu principalmente foi o gosto de 9ver impressas nos jornais, mostradores, folhetos, esquinas e, enfim, nas caixinhas do remédio, 8estas três palavras: Emplasto Brás Cubas. Para que negá-lo? Eu tinha a paixão do arruído, do cartaz, do foguete de lágrimas. Talvez os 11modestos me arguam esse defeito; fio, porém, que esse talento me 10hão de reconhecer os 12hábeis. Assim, 5a minha ideia trazia duas faces, como as medalhas, uma virada para o público, outra para mim. De um lado, filantropia e lucro; de outro, 2sede de nomeada. Digamos: — amor da glória.

Um tio meu, cônego de prebenda inteira, costumava dizer que o amor da glória temporal era a perdição das almas, que só devem cobiçar a glória eterna. 13Ao que retorquia outro tio, oficial de um dos antigos terços de infantaria, que o amor da glória era a coisa mais verdadeiramente humana que há no homem e, consequentemente, a sua mais genuína feição.

Decida o leitor entre o militar e o cônego; eu volto ao emplasto.

Machado de Assis. Memórias póstumas de Brás Cubas. Obra completa, v. I. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1992, p. 514-5 (com adaptações).

Com relação ao texto acima, à obra Memórias Póstumas de Brás Cubas e a aspectos por eles suscitados, julgue os itens subsequentes.

a) O compromisso do narrador com a verdade dos fatos, honestidade decorrente da vida além-túmulo, e o seu interesse pela ciência e pela filosofia aproximam a narrativa de Memórias Póstumas de Brás Cubas da forma de narrar do Naturalismo, ou seja, da descrição objetiva da realidade.
b) As “arrojadas cambalhotas” (ref. 1) da ideia inventiva de Brás Cubas relacionam-se à forma como Machado de Assis compôs esse romance, no qual o narrador intercala a narrativa de suas memórias com divagações acerca de temas diversos, o que produz constante vaivém na condução do enredo.
c) A narrativa das diferentes faces de uma mesma ideia expressa a singularidade do realismo machadiano, que ultrapassa as convenções realistas — focadas em desvelar as razões econômicas das causas humanitárias — e alcança dimensão mais profunda: a de desnudar o cinismo com que filantropia e lucro são reduzidos a caprichos do defunto autor em sua “sede de nomeada” (ref. 2).
d) A partir de Memórias Póstumas de Brás Cubas, o conjunto da obra machadiana divide-se em duas fases: a primeira é constituída por obras em que o foco narrativo é em terceira pessoa e o tema revela interesse pela sorte dos pobres, como em Helena, por exemplo; a segunda é formada de obras construídas a partir da perspectiva do narrador-personagem associado à classe dominante local, a exemplo de Dom Casmurro.
e) No trecho “pendurou-se-me uma ideia no trapézio que eu tinha no cérebro” (ref. 3), a combinação dos pronomes “se” e “me” exemplifica a variante padrão da língua portuguesa à época do texto. No que se refere ao português contemporâneo, uma estrutura equivalente que manteria a ênfase no sujeito da oração e a correção gramatical seria a seguinte: uma ideia pendurou-se no trapézio que eu tinha em meu cérebro.
f) Se considerada a noção de signo linguístico no trecho “até tomar a forma de um X: decifra-me ou devoro-te” (ref. 4), observa-se uma relação não arbitrária entre o significado de “X” e o seu significante, assim como acontece com o signo “ideia” no trecho “a minha ideia trazia duas faces, como as medalhas” (ref. 5).
g) No trecho “Na petição de privilégio que então redigi” (ref. 6), o pronome tem a função de complemento do verbo.
h) O termo “tudo” (ref. 7) especifica e resume as ideias evocadas na estrutura após o sinal de dois-pontos.
i) O termo “estas três palavras” (ref. 8) é complemento direto de “ver” (ref. 9) e sintetiza o termo coordenado que antecede essa expressão.
j) Em “hão de reconhecer” (ref. 10), o verbo auxiliar denota tempo futuro e de obrigatoriedade de ação, o que ratifica, no nível estrutural, a oposição postulada pelo autor entre “modestos” (ref. 11) e “hábeis” (ref. 12).
k) No texto, o vocábulo “sede” (ref. 2) significa ânsia, desejo e distingue-se de sede, local onde funciona a representação principal de firma ou empresa. No que se refere a esses dois vocábulos, o acento tônico é o recurso da língua com capacidade de discriminar os significados distintos.
l) No trecho “Ao que retorquia outro tio, oficial” (ref. 13), observa-se oração adjetiva como elemento modificador do aposto, que inicia o período.


Resposta:

a) Incorreto.
b) Correto.
c) Correto.
d) Correto.
e) Correto.
f) Incorreto.
g) Correto.
h) Incorreto.
i) Incorreto.
j) Incorreto.
k) Incorreto.
l) Correto.

Não são verdadeiras as avaliações respeitantes aos itens [A], [F], [H], [I], [J] e [K], pois:
 
Em [A], a narrativa de Memórias Póstumas de Brás Cubas representa a vertente realista de cunho psicológico, a qual, ao invés de descrever a sociedade objetiva e detalhadamente, se concentra na visão de mundo de seus personagens, expondo suas contradições. Assim, não se preocupa com a veracidade dos fatos, uma vez que pretende apenas gerar reflexões sobre o conflito da essência do ser humano frente às circunstâncias do mundo que o cerca.
Em [F], chama-se de “arbitrário” o sinal linguístico que nada contém em si mesmo da ideia que representa, estando o seu significado determinado pela relação que mantém com outros sinais. Ora os trechos citados constituem uma alegoria que explica a decisão de Brás Cubas em inventar o emplastro: a ideia transforma-se em figura humana e esta, na letra enigmática de um X, estabelecendo a incógnita cuja decifração depende exclusivamente do narrador. Assim, o sinal linguístico X não pode ser considerado “não arbitrário”.
Em [H], as funções especificativas ou resumitivas são determinadas pelo aposto, sempre relacionado com termos anteriores. Assim, a estrutura enunciada depois dos dois pontos é que especifica o termo “tudo” e não o contrário;
Em [I], o termo “estas três palavras” constitui um objeto direto com um único núcleo, portanto, não coordenado. As três palavras referidas serão mencionadas a seguir no aposto enumerativo “Emplasto Brás Cubas”.
Em [J], o verbo auxiliar denota tempo futuro e de obrigatoriedade, mas não está relacionado estruturalmente à oposição “modestos e “hábeis”. O narrador atribui a capacidade de percepção do seu talento apenas aos “hábeis”, inteligentes e astutos.
Em [K], ambas as palavras são paroxítonas, portanto, não é o acento tônico que as diferencia, mas sim o timbre da vogal tônica “e” que é fechado em sede quando significa ânsia, desejo e aberto em sede, local onde funciona a representação principal de firma ou empresa.



  
4. (Fgv 2012)  Os mecanismos constitucionais que caracterizam o Estado de direito têm o objetivo de defender o indivíduo dos abusos do poder. Em outras palavras, são garantias de liberdade, da assim chamada 1liberdade negativa, entendida como esfera de ação em que o indivíduo não está obrigado por quem detém o poder coativo a fazer aquilo que não deseja ou não está impedido de fazer aquilo que deseja. Há uma acepção de liberdade – que é a acepção prevalecente na tradição liberal – segundo a qual “liberdade” e “poder” são dois termos 3antitéticos, que denotam duas realidades em contraste entre si e são, portanto, incompatíveis: nas relações entre duas pessoas, à medida que se estende o poder (poder de comandar ou de impedir) de uma diminui a liberdade em sentido negativo da outra e, vice-versa, à medida que a segunda amplia a sua esfera de liberdade diminui o poder da primeira. Deve-se agora acrescentar que para o pensamento liberal a liberdade individual está garantida, mais que pelos mecanismos constitucionais do Estado de direito, também pelo fato de que ao Estado são reconhecidas tarefas limitadas à manutenção da ordem pública interna e internacional. No pensamento liberal, teoria do controle do poder e teoria da limitação das tarefas do Estado procedem no mesmo passo: pode-se até mesmo dizer que a segunda é a 2conditio sine qua non da primeira, no sentido de que o controle dos abusos do poder é tanto mais fácil quanto mais restrito é o âmbito em que o Estado pode estender a própria intervenção, ou mais breve e simplesmente no sentido de que o Estado mínimo é mais controlável do que o Estado máximo. Do ponto de vista do indivíduo, do qual se põe o liberalismo, o Estado é concebido como um mal necessário; e enquanto mal, embora necessário (e nisso o liberalismo se distingue do 4anarquismo), o Estado deve se intrometer o menos possível na esfera de ação dos indivíduos.

Noberto Bobbio, Liberalismo e democracia. São Paulo: Brasiliense, 2006.

a) Considerada no contexto, a expressão “liberdade negativa” (ref. 1) deve ser entendida como algo positivo para o indivíduo. Você concorda com essa afirmação? Justifique sua resposta.
b) Considerando o gênero a que pertence o texto, é adequado, do ponto de vista lógico, o emprego da expressão latina conditio sine qua non(ref. 2)? Justifique sua resposta.
c) É correto afirmar que os prefixos que ocorrem nas palavras “antitéticos” (ref. 3) e “anarquismo” (ref. 4) têm o mesmo sentido que os prefixos formadores, respectivamente, das palavras “antediluviano” e “amoral”? Justifique sua resposta.


Resposta:

a) Sim, pois o conceito de “liberdade negativa” traz subjacente a garantia de o indivíduo não ser obrigado a atos indesejados por abuso do poder constituído ou não ser impedido de fazer aquilo que deseja, ou seja, supõe um estado de direito em que sejam evitadas arbitrariedades por parte da esfera estatal.

b) Sim, a expressão “conditio sine qua non” é adequada ao contexto, erudito e de cunho científico, pois trata-se de uma expressão latina que remonta aos termos jurídicos do Direito romano e que pode ser traduzido como sem a/o qual não pode deixar de ser, indispensável. 

c) Não, os prefixos gregos ant(i) e a(n) que ocorrem nas palavras “antitéticos” e “ anarquismo” expressam oposição e negação, respectivamente. Já o prefixo latino ante e o de origem mista a das palavras “antediliviano” e “amoral” expressam anterioridade e ausência.



  
5. (Unb 2011)  Tornou-se costume desdobrar a cidadania em direitos civis, políticos e sociais. O cidadão pleno seria aquele que fosse titular dos três direitos. Cidadãos incompletos seriam os que possuíssem apenas alguns dos direitos. 3Os que não se beneficiassem de nenhum dos direitos seriam não cidadãos. Esclareço os conceitos. Direitos civis 2são os direitos fundamentais à vida, à liberdade, à propriedade, à igualdade 1perante a lei. Eles se desdobram na garantia de ir e vir, de escolher o trabalho, de manifestar o pensamento, de organizar-se, de ter respeitada a inviolabilidade do lar e da correspondência, de não ser preso a não ser pela autoridade competente e de acordo com as leis, de não ser condenado sem processo legal regular.
É possível haver direitos civis sem direitos políticos. Estes se referem à participação do cidadão no governo da sociedade. Seu exercício é limitado a parcela da população e consiste na capacidade de fazer demonstrações políticas, de organizar partidos, de votar, de ser votado. Finalmente, há os direitos sociais. Se os direitos civis garantem a vida em sociedade, se os direitos políticos garantem a participação no governo da sociedade, os direitos sociais garantem a participação na  riqueza coletiva. Eles incluem o direito à educação, ao trabalho, ao salário justo, à saúde, à aposentadoria. A garantia de sua vigência depende da existência de uma  eficiente máquina administrativa do Poder Executivo. Em tese, eles podem existir sem os direitos civis e, certamente, sem os direitos políticos.

José Murilo de Carvalho. Cidadania no Brasil: o longo caminho. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001, p. 9-10.

A partir das informações do texto, julgue os itens a seguir.

a) Seriam mantidos a correção gramatical e os sentidos originais do texto se a expressão “perante a lei” (ref. 1) fosse deslocada, entre vírgulas, para após a forma verbal “são” (ref. 2).
b) No trecho “Os que não se beneficiassem” (ref. 3), está subentendida a palavra cidadãos após o artigo “Os”.


Resposta:

a) Incorreta.
b) Incorreta.

É incorreto o que se afirma em [A], pois a expressão “perante a lei” está relacionada com o seu antecedente “igualdade”. Se fosse deslocada entre vírgulas para após a forma verbal “são” passaria a ficar relacionada com “todos os direitos civis”, o que alteraria o significado do período. Também é improcedente a afirmação em [B] de que o termo “os” é um artigo, já que se trata de um pronome demonstrativo. 

link para questões de outras disciplinas:



4 comentários:

  1. Acho que vocês não deveriam postar a resposta logo em seguida da questão. Assim a gente acaba vendo a resposta antes de resolver e isso não é muito legal.

    ResponderExcluir
  2. Valha-me Deus! É cada uma que a gente lê.....

    ResponderExcluir
  3. Valha-me Deus! É cada uma que a gente lê.....

    ResponderExcluir