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TEXTO PARA AS
PRÓXIMAS 2 QUESTÕES:
Recordações
do escrivão Isaías Caminha
Eu não sou literato, detesto com toda a
paixão essa espécie de animal. O que observei neles, no tempo em que estive na
redação do O Globo, foi o bastante para não os amar, nem os imitar. 1São
em geral de uma lastimável limitação de ideias, cheios de fórmulas, de
receitas, 9só capazes de colher fatos detalhados e impotentes para
generalizar, curvados aos fortes e às ideias vencedoras, e antigas, adstritos a
um infantil fetichismo do estilo e guiados por conceitos obsoletos e um pueril
e errôneo critério de beleza. Se me esforço por fazê-lo literário é para que
ele possa ser lido, pois quero falar das minhas dores e dos meus sofrimentos ao
espírito geral e no seu interesse, com a linguagem acessível a ele. É esse o
meu propósito, o meu único propósito. Não nego que para isso tenha procurado
modelos e normas. Procurei-os, confesso; e, agora mesmo, ao alcance das mãos,
tenho os autores que mais amo. (...) 5Confesso que os leio, que os
estudo, que procuro descobrir nos grandes romancistas o segredo de fazer. 6Mas
não é a ambição literária que me move ao procurar esse dom misterioso para
animar e fazer viver estas pálidas Recordações. Com elas, queria
modificar a opinião dos meus concidadãos, obrigá-los a pensar de outro modo, a
não se encherem de hostilidade e má vontade quando encontrarem na vida um rapaz
como eu e com os desejos que tinha há dez anos passados. Tento mostrar que são
legítimos e, se não merecedores de apoio, pelo menos dignos de indiferença.
7Entretanto, quantas dores,
quantas angústias! 2Vivo aqui só, isto é, sem relações intelectuais
de qualquer ordem. Cercam-me dois ou três bacharéis idiotas e um médico
mezinheiro, 10repletos de orgulho de suas cartas que sabe Deus como tiraram.
(...) Entretanto, se eu amanhã lhes fosse falar neste livro - que espanto! que
sarcasmo! que crítica desanimadora não fariam. Depois que se foi o doutor
Graciliano, excepcionalmente simples e esquecido de sua carta apergaminhada,
nada digo das minhas leituras, não falo das minhas lucubrações intelectuais a
ninguém, e minha mulher, quando me demoro escrevendo pela noite afora, grita-me
do quarto:
3– Vem dormir, Isaías! Deixa
esse relatório para amanhã!
De forma que não tenho por onde aferir se as
minhas Recordações preenchem o fim a que as destino; se a minha
inabilidade literária está prejudicando completamente o seu pensamento. Que
tortura! E não é só isso: envergonho-me por esta ou aquela passagem em que me
acho, em que 11me dispo em frente de desconhecidos, como uma mulher
pública... 12Sofro assim de tantos modos, por causa desta obra, que
julgo que esse mal-estar, com que às vezes acordo, vem dela, unicamente dela.
Quero abandoná-la; mas não posso absolutamente. De manhã, ao almoço, na
coletoria, na botica, jantando, banhando-me, só penso nela. À noite, quando
todos em casa se vão recolhendo, insensivelmente aproximo-me da mesa e escrevo
furiosamente. Estou no sexto capítulo e ainda não me preocupei em fazê-la
pública, anunciar e arranjar um bom recebimento dos detentores da opinião
nacional. 13Que ela tenha a sorte que merecer, mas que possa também,
amanhã ou daqui a séculos, despertar um escritor mais hábil que a refaça e que
diga o que não pude nem soube dizer.
(...) 8Imagino como um escritor
hábil não saberia dizer o que eu senti lá dentro. Eu que sofri e pensei não o
sei narrar. 4Já por duas vezes, tentei escrever; mas, relendo a
página, achei-a incolor, comum, e, sobretudo, pouco expressiva do que eu de
fato tinha sentido.
LIMA BARRETO
Recordações do escrivão Isaías Caminha. São Paulo: Penguin Classics Companhia das
Letras, 2010.
1.
(Uerj 2013) O texto de Lima Barreto
explora o recurso da metalinguagem, ao comentar, na sua ficção, o próprio ato
de compor uma ficção. Esse recurso está exemplificado principalmente em:
a) São em geral de uma
lastimável limitação de ideias, (ref. 1)
b) Vivo aqui só, isto é, sem
relações intelectuais de qualquer ordem. (ref. 2)
c) – Vem dormir, Isaías! Deixa
esse relatório para amanhã! (ref. 3)
d) Já por duas vezes, tentei
escrever; mas, relendo a página, achei-a incolor, comum, (ref. 4)
Resposta:
[D]
Na frase da
opção [D] existe metalinguagem, ato de comunicação em que se usa a linguagem
para falar sobre a própria linguagem.
2.
(Uerj 2013) O emprego de sinais de
pontuação contribui para a construção do sentido dos textos. O emprego de
exclamações, no segundo parágrafo, reforça o seguinte elemento relativo ao
narrador:
a) ironia
b) mágoa
c) timidez
d) insegurança
Resposta:
[B]
As
exclamações, que emprestam forte carga subjetiva às frases nominais (“quantas
dores, quantas angústias!”, “que espanto! que sarcasmo!”), revelam o sentimento
de mágoa do narrador perante a hipocrisia social em que se sente mergulhado.
3. (Enem 2012) TEXTO I
Antigamente
Antigamente,
os pirralhos dobravam a língua diante dos pais e se um se esquecia de arear os
dentes antes de cair nos braços de Morfeu, era capaz de entrar no couro. Não
devia também se esquecer de lavar os pés, sem tugir nem mugir. Nada de bater na
cacunda do padrinho, nem de debicar os mais velhos, pois levava tunda. Ainda
cedinho, aguava as plantas, ia ao corte e logo voltava aos penates. Não ficava
mangando na rua nem escapulia do mestre, mesmo que não entendesse patavina da
instrução moral e cívica. O verdadeiro smart calçava botina de botões para
comparecer todo liró ao copo d’água, se bem que no convescote apenas
lambiscasse, para evitar flatos. Os bilontras é que eram um precipício, jogando
com pau de dois bicos, pelo que carecia muita cautela e caldo de galinha. O
melhor era pôr as barbas de molho diante de um treteiro de topete, depois de
fintar e engambelar os coiós, e antes que se pudesse tudo em pratos limpos, ele
abria o arco.
ANDRADE, C. D. Poesia e prosa.
Rio de janeiro: nova Aguilar, 1983 (fragmento).
TEXTO II
Palavras do arco da velha
|
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Expressão
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Significado
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Cair nos braços de Morfeu
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Dormir
|
|
Debicar
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Zombar, ridicularizar
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Tunda
|
Surra
|
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Mangar
|
Escarnecer, caçoar
|
|
Tugir
|
Murmurar
|
|
Liró
|
Bem-vestido
|
|
Copo d’água
|
Lanche oferecido pelos amigos
|
|
Convescote
|
Piquenique
|
|
Bilontra
|
Velhaco
|
|
Treteiro de topete
|
Tratante atrevido
|
|
Abrir o arco
|
Fugir
|
|
FLORIN, J. L. As línguas
mudam. In: Revista Língua Portuguesa, n. 24, out. 2007 (adaptado).
|
Na leitura do
fragmento do texto Antigamente
constata-se, pelo emprego de palavras obsoletas, que itens lexicais outrora
produtivos não mais o são no português brasileiro atual. Esse fenômeno revela
que
a) a língua portuguesa de
antigamente carecia de termos para se referir a fatos e coisas do cotidiano.
b) o português brasileiro se
constitui evitando a ampliação do léxico proveniente do português europeu.
c) a heterogeneidade do
português leva a uma estabilidade do seu léxico no eixo temporal.
d) o português brasileiro
apoia-se no léxico inglês para ser reconhecido como língua independente.
e) o léxico do português
representa uma realidade linguística variável e diversificada.
Resposta:
[E]
O escritor
usa o bom humor para enumerar comportamentos do passado através de expressões
também notoriamente ultrapassadas. Tal recurso coloca em evidência que o léxico
do português é suscetível de mudanças relativamente a tempo e espaço,
refletindo a diversidade dos enunciantes. Assim, é correta a opção [E].
4.
(Enem 2012) Aquele bêbado
— Juro
nunca mais beber — e fez o sinal da cruz com os indicadores. Acrescentou: —
Álcool.
O mais,
ele achou que podia beber. Bebia paisagens, músicas de Tom Jobim, versos de
Mário Quintana. Tomou um pileque de Segall. Nos fins de semana embebedava-se de
Índia Reclinada, de Celso Antônio.
—
Curou-se 100% de vício — comentavam os amigos.
Só ele
sabia que andava bêbado que nem um gambá. Morreu de etilismo abstrato, no meio
de uma carraspana de pôr do sol no Leblon, e seu féretro ostentava inúmeras
coroas de ex-alcoólatras anônimos.
ANDRADE, C. D. Contos plausíveis. Rio de Janeiro: Record, 1991.
A causa mortis do personagem, expressa no último parágrafo, adquire um efeito irônico
no texto porque, ao longo da narrativa, ocorre uma
a) metaforização do sentido
literal do verbo “beber”.
b) aproximação exagerada da
estética abstracionista.
c) apresentação gradativa da
coloquialidade da linguagem.
d) exploração hiperbólica da
expressão “inúmeras coroas”.
e) citação aleatória de nomes
de diferentes artistas.
Resposta:
[A]
Em “Aquele bêbado”, o personagem decidiu que iria deixar de consumir
álcool, mas acabou por morrer de “etilismo abstrato”. O paradoxo da expressão
revela o uso metafórico do verbo “beber” para descrever a atitude apaixonada de
quem se entrega às sensações para admirar intensamente o espetáculo da vida e
usufruir do prazer pleno que as múltiplas e variadas manifestações artísticas
lhe provocavam. Assim, é correta a opção [A].
5. (Enem 2012) Labaredas nas trevas
Fragmentos do diário secreto de
Teodor Konrad Nalecz Korzeniowski
20 DE JULHO [1912]
Peter Sumerville pede-me
que escreva um artigo sobre Crane. Envio-lhe uma carta: “Acredite-me, prezado
senhor, nenhum jornal ou revista se interessaria por qualquer coisa que eu, ou
outra pessoa, escrevesse sobre Stephen Crane. Ririam da sugestão. [...]
Dificilmente encontro alguém, agora, que saiba quem é Stephen Crane ou
lembre-se de algo dele. Para os jovens escritores que estão surgindo ele
simplesmente não existe”.
20 DE DEZEMBRO [1919]
Muito peixe foi embrulhado
pelas folhas de jornal. Sou reconhecido como o maior escritor vivo da língua
inglesa. Já se passaram dezenove anos desde que Crane morreu, mas eu não o
esqueço. E parece que outros também não. The
London Mercury resolveu celebrar os vinte e cinco anos de publicação de um
livro que, segundo eles, foi “um fenômeno hoje esquecido” e me pediram um
artigo.
FONSECA, R. Romance negro e outras
histórias. São Paulo: Companhia das Letras, 1992 (fragmentado).
Na construção de textos
literários, os autores recorrem com frequência a expressões metafóricas. Ao
empregar o enunciado metafórico “Muito peixe foi embrulhado pelas folhas de
jornal”, pretendeu-se estabelecer, entre dois fragmentos do texto em questão, uma
relação semântica de
a) Causalidade, segundo a qual
se relacionam as partes de um texto, em que uma contém a causa e a outra, a
consequência.
b) Temporalidade, segundo a
qual se articulam as partes de um texto, situando no tempo o que é relatado nas
partes em questão.
c) Condicionalidade, segundo a
qual se combinam duas partes de um texto, em que uma resulta ou depende de
circunstâncias apresentadas à outra.
d) Adversidade, segundo a qual
se articulam duas partes de um texto em que uma apresenta uma orientação
argumentativa distinta e oposta à outra.
e) Finalidade, segundo a qual
se articulam duas partes de um texto em que uma apresenta o meio, por exemplo,
para uma ação e a outra, o desfecho da mesma.
Resposta:
[B]
É correta a
opção [A], pois a expressão “Muito peixe foi embrulhado pelas folhas de jornal”
alude metaforicamente ao tempo que decorreu entre o primeiro e segundo
fragmentos escritos pelo personagem narrador, Teodor Konrad.
6. (Enem 2012) Cabeludinho
Quando a Vó me recebeu nas
férias, ela me apresentou aos amigos: Este é meu neto. Ele foi estudar no Rio e
voltou de ateu. Ela disse que eu voltei de ateu. Aquela preposição deslocada me
fantasiava de ateu. Como quem dissesse no Carnaval: aquele menino está
fantasiado de palhaço. Minha avó entendia de regências verbais. Ela falava de
sério. Mas todo-mundo riu. Porque aquela preposição deslocada podia fazer de
uma informação um chiste. E fez. E mais: eu acho que buscar a beleza nas
palavras é uma solenidade de amor. E pode ser instrumento de rir. De outra
feita, no meio da pelada um menino gritou: Disilimina esse, Cabeludinho. Eu não
disilimei ninguém. Mas aquele verbo novo trouxe um perfume de poesia a nossa
quadra. Aprendi nessas férias a brincar de palavras mais do que trabalhar com
elas. Comecei a não gostar de palavra engavetada. Aquela que não pode mudar de
lugar. Aprendi a gostar mais das palavras pelo que elas entoam do que pelo que
elas informam. Por depois ouvi um vaqueiro a cantar com saudade: Ai morena, não
me escreve / que eu não sei a ler. Aquele a preposto ao verbo ler, ao meu
ouvir, ampliava a solidão do vaqueiro.
BARROS, M. Memórias inventadas:
a infância. São Paulo: Planeta, 2003.
No texto, o autor
desenvolve uma reflexão sobre diferentes possibilidades de uso da língua e
sobre os sentidos que esses usos podem produzir, a exemplo das expressões
“voltou de ateu”, “desilimina esse” e “eu não sei a ler”. Com essa reflexão, o
autor destaca
a) os desvios linguísticos
cometidos pelos personagens do texto.
b) a importância de certos
fenômenos gramaticais para o conhecimento da língua portuguesa.
c) a distinção clara entre a
norma culta e as outras variedades linguísticas.
d) o relato fiel de episódios
vividos por Cabeludinho durante as suas férias.
e) a valorização da dimensão
lúdica e poética presente nos usos coloquiais da linguagem.
Resposta:
[E]
Manoel de
Barros, ao afirmar que “buscar a beleza nas palavras é uma solenidade de amor.
E pode ser instrumento de rir”, demonstra que valoriza a essência da linguagem
coloquial, interpretando neologismos, expressões e particularidades da fala.
Segundo o autor, embora se afastem do sentido literal das palavras e
desobedeçam a regras gramaticais, esses “desvios” contribuem para ampliar o seu
significado e imprimem a função poética ao enunciado. Assim, é correta a opção
[E].
7.
(Enem 2012) Leia.
O senhor
Carta a uma jovem que, estando em uma roda em que dava aos presentes o
tratamento de você, se dirigiu ao autor chamando-o “o senhor”:
Senhora:
Aquele a quem chamastes senhor aqui está, de peito magoado e cara
triste, para vos dizer que senhor ele não é, de nada, nem de ninguém.
Bem o sabeis, por certo, que a única nobreza do plebeu está em não
querer esconder sua condição, e esta nobreza tenho eu. Assim, se entre tantos
senhores ricos e nobres a quem chamáveis você escolhestes a mim para tratar de
senhor, e bem de ver que só poderíeis ter encontrado essa senhoria nas rugas de
minha testa e na prata de meus cabelos. Senhor de muitos anos, eis aí; o
território onde eu mando é no país do tempo que foi. Essa palavra “senhor”, no
meio de uma frase, ergueu entre nós um muro frio e triste.
Vi o muro e calei: não é de muito, eu juro, que me acontece essa
tristeza; mas também não era a vez primeira.
BRAGA, R. A borboleta amarela. Rio de Janeiro:
Record, 1991.
A
escolha do tratamento que se queira atribuir a alguém geralmente considera as
situações específicas de uso social. A violação desse princípio causou um
mal-estar no autor da carta. O trecho que descreve essa violação é:
a) “Essa palavra, ‘senhor’, no
meio de uma frase ergueu entre nós um muro frio e triste”.
b) “A única nobreza do plebeu
está em não querer esconder a sua condição”.
c) “Só poderíeis ter
encontrado essa senhoria nas rugas de minha testa”.
d) “O território onde eu mando
é no país do tempo que foi”.
e) “Não é de muito, eu juro,
que acontece essa tristeza; mas também não era a vez primeira”.
Resposta:
[A]
Percebe-se que a sensação de mal-estar do autor da carta tinha sido
provocada pela forma de tratamento com que uma jovem se dirigira a ele. Na
opção [A], transcreve-se a frase comprovativa de que o tratamento distante e
cerimonioso não tinha sido adequado ao ambiente informal e excluíra o autor do
grupo de pessoas que era tratado à vontade.
8. (Enem 2012) E como manejava bem os
cordéis de seus títeres, ou ele mesmo, títere voluntário e consciente, como
entregava o braço, as pernas, a cabeça, o tronco, como se desfazia de suas
articulações e de seus reflexos quando achava nisso conveniência. Também ele
soubera apoderar-se dessa arte, mais artifício, toda feita de sutilezas e
grosserias, de expectativa e oportunidade, de insônia e submissão, de silêncios
e rompantes, de anulação e prepotência. Conhecia a palavra exata para o momento
preciso, a frase picante ou obscena no ambiente adequado, o tom humilde diante
do superior útil, o grosseiro diante do inferior, o arrogante quando o poderoso
em nada o podia prejudicar. Sabia desfazer situações equivocadas, e armar intrigas
das quais se saía sempre bem, e sabia, por experiência própria, que a fortuna
se ganha com uma frase, num dado momento, que este momento único,
irrecuperável, irreversível, exige um estado de alerta para sua apropriação.
RAWET, S. O aprendizado. In: Diálogo.
Rio de janeiro: GRD, 1963 (fragmentado).
No conto, o autor retrata
criticamente a habilidade do personagem no manejo de discursos diferentes
segundos a posição do interlocutor na sociedade. A crítica à conduta do
personagem está centrada
a) Na imagem do títere ou
fantoche em que o personagem acaba por se transformar, acreditando dominar os
jogos de poder na linguagem.
b) Na alusão à falta de
articulações e reflexos do personagem, dando a entender que ele não possui o
manejo dos jogos discursivos em todas as situações.
c) No comentário, feito em tom
de censura pelo autor, sobre as frases obscenas que o personagem emite em
determinados ambientes sociais.
d) Nas expressões que mostram
tons opostos nos discursos empregados aleatoriamente pelo personagem em
conversas com interlocutores variados.
e) No falso elogio à
originalidade atribuída a esse personagem, responsável por seu sucesso no
aprendizado das regras de linguagem da sociedade.
Resposta:
[A]
O narrador apresenta o
personagem como um indivíduo sem caráter que manipulava os outros com a
habilidade do discurso e também se moldava hipocritamente a ideias ou
comportamentos alheios quando isso lhe era conveniente: “ele mesmo, títere
voluntário e consciente, como entregava o braço, as pernas, a cabeça, o tronco,
como se desfazia de suas articulações e de seus reflexos quando achava nisso
conveniência”. Assim, é correta a opção [A].
9. (Enem 2012) Desde dezoito anos que o
tal patriotismo lhe absorvia e por ele fizera a tolice de estudar inutilidades.
Que lhe importavam os rios? Eram grandes? Pois que fossem... Em que lhe
contribuía para a felicidade saber o nome dos heróis do Brasil? Em nada... O
importante é que ele tivesse sido feliz. Foi? Não. Lembrou-se das coisas do tupi,
do folk-lore, das suas tentativas
agrícolas... Restava disso tudo em sua alma uma satisfação? Nenhuma! Nenhuma!
O tupi encontrou a
incredulidade geral, o riso, a mofa, o escárnio; e levou-o à loucura. Uma
decepção. E a agricultura? Nada. As terras não eram ferazes e ela não era fácil
como diziam os livros. Outra decepção. E, quando o seu patriotismo se fizera
combatente, o que achara? Decepções. Onde estava a doçura de nossa gente? Pois
ele a viu combater como feras? Pois não a via matar prisioneiros, inúmeros?
Outra decepção. A sua vida era uma decepção, uma série, melhor, um encadeamento
de decepções.
A pátria que quisera ter
era um mito; um fantasma criado por ele no silêncio de seu gabinete.
BARRETO, L. Triste fim de
Policarpo Quaresma. Disponível em: www.dominiopublico.gov.br. Acesso em: 8
nov. 2011.
O romance Triste fim de Policarpo Quaresma, de
Lima Barreto, foi publicado em 1911. No fragmento destacado, a reação do
personagem aos desdobramentos de suas iniciativas patrióticas evidencia que
a) A dedicação de Policarpo
Quaresma ao conhecimento da natureza brasileira levou-o a estudar inutilidades,
mas possibilitou-lhe uma visão mais ampla do país.
b) A curiosidade em relação
aos heróis da pátria levou-o ao ideal de prosperidade e democracia que o
personagem encontra no contexto republicano.
c) A construção de uma pátria
a partir de elementos míticos, como a cordialidade do povo, a riqueza do solo e
a pureza linguística, conduz à frustração ideológica.
d) A propensão do brasileiro
ao riso, ao escárnio, justifica a reação de decepção e desistência de Policarpo
Quaresma, que prefere resguardar-se em seu gabinete.
e) A certeza da fertilidade da
terra e da produção agrícola incondicional faz parte de um projeto ideológico
salvacionista, tal como foi difundido na época do autor.
Resposta:
[C]
É correta a opção [C], pois o fragmento destacado é revelador de
reflexões amargas e da desilusão de Policarpo sobre os três projetos
(linguístico, agrícola e político) que havia idealizado para ao Brasil e não
tinham dado certo. Ridicularizado por todos e acusado de traição à pátria, tem
consciência de que o país que sonhara nada tinha a ver com a realidade que o
cercava e todos os seus esforços haviam sido inúteis e ingênuos.
10. (Enem 2012) Ai,
palavras, ai, palavras
Que estranha potência a vossa!
Todo o sentido da vida
Principia a vossa porta:
O mel do amor cristaliza
Seu perfume em vossa rosa;
Sois o sonho e sois a audácia,
Calúnia, fúria, derrota...
A liberdade das almas,
ai! Com letras se elabora...
e dos venenos humanos
sois a mais fina retorta:
frágil, frágil, como o vidro
e mais que o aço poderosa!
Reis, impérios, povos, tempos,
pelo vosso impulso rodam...
MEIRELES, C.
Obra poética. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1985 (fragmento).
O fragmento destacado foi transcrito do Romanceiro
da Independência, de Cecília Meireles. Centralizada no episódio histórico
da Inconfidência Mineira, a obra, no entanto, elabora uma reflexão mais ampla
sobre a seguinte relação entre o homem e a linguagem:
a) A força e a resistência humanas superam os danos provocados pelo poder
corrosivo das palavras.
b) As relações humanas, em suas múltiplas esferas, têm seu equilíbrio
vinculado aos significado das palavras.
c) O significado dos nomes não expressa de forma justa e completa a
grandeza da luta do homem pela vida.
d) Renovando o significado das palavras, o tempo permite às gerações
perpetuar seus valores e suas crenças.
e) Como produto da criatividade humana, a linguagem tem seu alcance
limitado pelas intenções e gestos.
Resposta:
[B]
É correta a opção [B], pois o poema destaca a potência das palavras em
designar as relações humanas, tanto no âmbito das realizações, dos sentimentos
ou da construção do imaginário sensível: “amor”, “sonho”, “audácia”, “calúnia”,
“fúria”, “derrota”.
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