sexta-feira, 19 de abril de 2013

Termos da oração e Interpretação de texto - Questões discursivas com gabarito comentado.








TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
Texto 1

A história dos povos está atravessada pela viagem, como realidade ou metáfora. 1Todas as formas de sociedade, compreendendo tribos e clãs, nações e nacionalidades, colônias e impérios, trabalham e retrabalham a viagem, seja como modo de descobrir o “outro”, seja como modo de descobrir o “eu”. É como se a viagem, o viajante e a sua narrativa revelassem todo o tempo o que se sabe e o que não se sabe, o conhecido e o desconhecido, o próximo e o remoto, o real e o virtual. A viagem pode ser breve ou demorada, instantânea ou de longa duração, delimitada ou interminável, passada, presente ou futura. Também pode ser peregrina, mercantil ou conquistadora, tanto quanto turística, missionária ou aventurosa. Pode ser filosófica, artística ou científica. Em geral, a viagem compreende várias significações e conotações, simultâneas, complementares ou mesmo contraditórias. São muitas as formas das viagens reais ou imaginárias, demarcando momentos ou épocas mais ou menos notáveis da vida de indivíduos, famílias, grupos, coletividades, povos, tribos, clãs, nações, nacionalidades, culturas e civilizações. São muitos os que buscam o desconhecido, a experiência insuspeitada, a surpresa da novidade, a tensão escondida nas outras formas de ser, sentir, agir, realizar, lutar, pensar ou imaginar.

IANNI, Octavio. A metáfora da viagem. In: IANNI, Octavio. Enigmas da Modernidade-Mundo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000. p. 13-14.


1. (Pucrj 2013)  Texto 2

Apesar de consideradas pela crítica, durante muito tempo, uma manifestação menor da literatura, as narrativas de viagem viveram momentos de glória no passado. Inúmeros escritores se dedicaram ao gênero, e eram muitos os leitores aficionados pelos relatos de aventuras. Na forma de diários, memórias ou simplesmente impressões de viagens, os textos surgiam aos borbotões, nos séculos XVIII e XIX, ora inspirados pelo Velho, ora pelo Novo Mundo, expressando sempre o olhar fascinado, a curiosidade e o desejo do viajante de deixar registrada a sua experiência, que ele julgava ímpar.
Na Europa, os destinos mais buscados eram a Alemanha, a Itália e a Espanha, fosse pela mitologia, pela glória passada ou pela profusão de ruínas históricas. E não importava se a viagem durasse semanas, meses ou anos; interessava relatá-la e assim se inscrever na tradição do gênero. Dentre os mais ilustres viajantes, Goethe, Mme. de Stäel, Victor Hugo, Michelet, Lamartine e Mérimée foram autores que incentivaram outros escritores a também excursionar e a escrever sobre as novas terras.
A América foi igualmente pródiga em inspirar viajantes - em sua maioria pintores, botânicos, naturalistas, arqueólogos ou simples aventureiros -, ainda que a maioria não tivesse pretensões literárias e quisesse apenas fazer anotações acerca da geografia, fauna e flora tropical das novas terras.
Octavio Ianni, em A metáfora da viagem, afirma que a história dos povos “está atravessada pela viagem”, não importa se real (se ocorre o deslocamento geográfico, espacial e temporal), ou metafórica (sem o deslocamento físico, mas apenas o sensível ou sensorial), pois toda sociedade trabalha a viagem, “seja como modo de descobrir o ‘outro’, seja como modo de descobrir o ‘eu’”. A viagem destina-se, portanto, a ultrapassar fronteiras, a demarcar as diferenças e as semelhanças entre os povos.
E, se consideramos as condições em que os deslocamentos eram realizados, as enormes distâncias, o desconforto de navios, carros de bois e ferrovias, além dos perigos de toda natureza a que estavam sujeitos, causa espanto encontrar tantas mulheres, dentre os viajantes, que ousaram deixar a segurança de seus lares, suas famílias e enfrentar o preconceito, as novas fronteiras, o desconhecido.

DUARTE, Constância Lima; MUZZART, Zahidé Lupinacci. Pensar o outro ou quando as mulheres viajam. Revista Estudos Feministas. vol.16 n.3. Florianópolis. Setembro/dezembro. 2008. Apresentação. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-026X2008000300018&script=sci_arttext>. Acesso em: 12 ago. 2012.

a) A voz do pensador Octavio Ianni, autor do texto 1, foi empregada no texto 2 com um propósito discursivo. Explique a relação que se estabelece entre a citação de Ianni e o texto 2.
b) A diferença de sentido entre as frases abaixo é decorrente da posição do adjunto adverbial “durante muito tempo”. Justifique essa afirmativa, explicitando a diferença.
i. “Apesar de consideradas pela crítica, durante muito tempo, uma manifestação menor da literatura, as narrativas de viagem viveram momentos de glória no passado.”
ii. Apesar de consideradas pela crítica uma manifestação menor da literatura, as narrativas de viagem, durante muito tempo, viveram momentos de glória no passado.


Resposta:

a) A citação de Ianni apoia a ideia da presença marcante das viagens na história das sociedades, como forma de descobrir o outro e a si mesmo.
b) Em i, o adjunto adverbial incide sobre o verbo considerar e, em ii, modifica o verbo viver.



  
2. (Unb 2012)  Ajustou, na medida, umas talas de cálamo exatas,
E, do dorso através e da pele, enfiou no quelônio
E, conforme pensava, uma pele de boi esticou
E dois braços extremos dispôs, por travessa ajuntados.
Sete cordas de tripa de ovelha estendeu harmoniosas.
Ao depois de fazê-lo, tomou do amorável brinquedo
E co’um plectro uma a uma provou cada corda, aos seus dedos
Ressoava tremenda.

Homero. Hinos homéricos. Hino a Hermes, v. 44-53. Introdução e tradução de Jair Gramacho. Brasília: UnB, 2003.

Com referência ao texto acima e a conhecimentos relativos à propagação de ondas sonoras, julgue o item a seguir.

No verso “Ao depois de fazê-lo, tomou do amorável brinquedo” (v.6), o emprego do complemento iniciado por preposição exemplifica recurso estilístico que não altera a transitividade da forma verbal “tomou”.


Resposta:

Correto.

É correta a afirmação, pois a preposição “de”, aglutinada ao artigo do objeto direto (“o amorável brinquedo”), não altera a transitividade do verbo. Trata-se de um objeto direto preposicionado, usado para fins estilísticos.



  
3. (Unb 2012)  Texto I

LXXIX

Entre este álamo, ó Lise, e essa corrente,
Que agora estão meus olhos contemplando,
Parece que hoje o céu me vem pintando
A mágoa triste, que meu peito sente.

Firmeza a nenhum deles se consente
Ao doce respirar do vento brando;
O tronco a cada instante meneando,
A fonte nunca firme, ou permanente.

Na líquida porção, na vegetante
Cópia daquelas ramas se figura
Outro rosto, outra imagem semelhante:

Quem não sabe que a tua formosura
Sempre móvel está, sempre inconstante,
Nunca fixa se viu, nunca segura?

Cláudio Manoel da Costa. Apud Domício Proença Filho. A poesia dos inconfidentes. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2002, p. 85.

Texto II

O espelho

O
espelho: atra
vés
de seu líquido nada
me des
dobro.

Ser quem me
olha
e olhar seus
olhos
nada de
nada
duplo
mistério.

Não amo
o espelho: temo-o.

Orides Fontela. Poesia reunida (1969-1996). São Paulo: Cosac Naify; Rio de Janeiro: 7letras, 2006, p. 212.

Considerando os textos acima apresentados, o primeiro, um soneto árcade do Brasil Colônia, e o segundo, um poema da literatura brasileira contemporânea, julgue os itens a seguir.

a) Na atmosfera bucólica do soneto LXXIX, submetida às convenções da poesia pastoral, a natureza é apresentada como cenário estático e artificial, no qual o eu lírico não encontra espaço para manifestar, de forma mais profunda, as verdadeiras emoções humanas.
b) Na última estrofe do poema O espelho, nos versos “Não amo / o espelho: temo-o”, o pronome átono exemplifica uma substituição pronominal caracterizada, na gramática normativa, como objeto direto pleonástico.
c) No soneto LXXIX, há referências ao próprio ato de representação artística nas seguintes imagens poéticas: “Parece que hoje o céu me vem pintando” (v.3) e “Na líquida porção, na vegetante / Cópia daquelas ramas se figura” (v.9-10).
d) A adoção de formas clássicas europeias, tanto na lírica de Cláudio Manoel da Costa quanto nos épicos Uraguai, de Basílio da Gama, e Caramuru, de Santa Rita Durão, impediu que a realidade da Colônia fosse inserida na produção literária do Arcadismo brasileiro.
e) A temática lírico-amorosa do soneto LXXIX evoca o mito de Narciso, como evidenciam os versos em que o eu lírico mira sua imagem nas águas de uma fonte, o que se realiza, no entanto, de maneira renovada, uma vez que, no reflexo artístico produzido pelos versos, estão associados os conflitos do mundo interno do eu lírico à instabilidade do mundo.
f) No poema O espelho, nos versos “Ser quem me / olha / e olhar seus / olhos”, o possessivo “seus” tem como referente a estrutura predicativa “quem me / olha”.


Resposta:

a) Incorreto.
b) Incorreto.
c) Correto.
d) Incorreto.
e) Correto.
f) Correto.

Não são corretas as afirmações em [A], [B] e [D], pois:

Em [A], no 4º verso do soneto, “a mágoa triste, que meu peito sente”, existe subjetividade e expressão de emoções.
Em [B], não existe objeto direto preposicionado nos dois últimos versos do poema, pois seus objetos diretos pertencem a duas orações distintas, coordenadas entre si. “O espelho” é objeto direto do verbo amar, e o pronome oblíquo átono “o” é objeto direto do verbo temer,
Em [D], os épicos Caramuru e O Uraguai desenvolvem  temas da história colonial, introduzindo descrições da paisagem tropical do Brasil do país e a figura do índio como herói.  




TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
TEXTO I

            Eu estava deitado num velho sofá amplo. 3Lá fora, a chuva caía com redobrado rigor e ventava fortemente. A nossa casa frágil parecia que, de um momento para outro, ia ser arrasada. 1Minha mãe ia e vinha de um quarto próximo; removia baús, arcas; cosia, futicava. Eu devaneava e ia-lhe vendo o perfil esquálido, o corpo magro, premido de trabalhos, as faces cavadas com os malares salientes, tendo pela pele parda manchas escuras, como se fossem de fumaça entranhada. 4De quando em quando, ela lançava-me os seus olhos aveludados, redondos, passivamente bons, onde havia raias de temor ao encarar-me. Supus que adivinhava os perigos que eu tinha de passar; sofrimentos e dores que a educação e inteligência, qualidades a mais na minha frágil consistência social, haviam de atrair fatalmente. 2Não sei que de raro, excepcional e delicado, e ao mesmo tempo perigoso, ela via em mim, para me deitar aqueles olhares de amor e espanto, de piedade e orgulho.

LIMA BARRETO. Recordações do escrivão Isaías Caminha. Rio de Janeiro; Belo Horizonte: Livraria Garnier, 1989. p.26-27.


TEXTO II

TEIA de aranha, galho seco da roseira,
quem sou?
Luz calçada em alpargatas de prata
rapta as flores da fronha,
quem sou?
Pássaro que mora na neblina
destila seu canto de água limpa
– longe, sozinho –
me diga quem sou.

ROQUETTE-PINTO, Claudia. Corola. São Paulo: Ateliê Editorial, 2000. p. 67.


4. (Uff 2012)  No texto I, vários recursos gramaticais são usados para garantir a progressão, a coesão e a coerência.
Observe no texto o uso das expressões “Lá fora” (ref. 3) e “De quando em quando” (ref. 4). Em seguida:

a) Identifique a função sintática exercida por cada uma;
b) Explique a importância dessas expressões para a progressão textual.  


Resposta:

a) A expressão “lá fora” é adjunto adverbial de lugar e “de quando em quando” é adjunto adverbial de tempo. Ou: ambas são adjuntos adverbiais.

b) Essas expressões servem para mostrar o progresso da narrativa no tempo e no espaço.
Ou: Tais expressões mostram a sucessão dos acontecimentos no espaço e no tempo, garantindo a progressão da narrativa.
Ou: As expressões, ao localizar a ação no tempo e no espaço, contribuem para a progressão textual, porque particularizam os lugares em que a ação se desenrola (lá fora opondo-se ao aqui dentro do espaço da casa) e indicam a passagem do tempo, que dinamiza a ação narrada.
Ou: Uma narrativa caracteriza-se por sucessões de acontecimentos e transformações. No caso analisado, as expressões destacadas mostram o desenrolar dos fatos no tempo e no espaço e, com isso, garantem a progressão da narrativa.




TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
No texto a seguir, de João Guimarães Rosa, a face, a imagem, está no âmbito da reflexão especular: real, virtual, simbólica.

O espelho

Se quer seguir-me, narro-lhe; não uma aventura, mas experiência, a que me induziram, alternadamente, séries de raciocínios e intuições. Tomou-me tempo. Surpreendo-me, porém, um tanto à parte de todos, penetrando conhecimento que os outros ainda ignoram. O senhor, por exemplo, que sabe e estuda, suponho nem tenha ideia do que seja, na verdade — um espelho? Decerto, das noções de física, com que se familiarizou, as leis da ótica. Reporto-me ao transcendente, todavia...

O espelho, são muitos, captando-lhe as feições; 6todos refletem-lhe o rosto, e 5o senhor crê-se com 4aspecto próprio e praticamente inalterado, 3do qual lhe dão imagem fiel. Mas — que espelho? Há-os bons e maus, os que favorecem e os que detraem; e os que são apenas honestos, pois não. E onde situar o nível e ponto dessa honestidade ou fidedignidade?

1Como é que o senhor, eu, os restantes próximos, somos, no visível? O senhor dirá: as 7fotografias o comprovam. Respondo: que, além de prevalecerem para as 8lentes das máquinas objeções análogas, seus resultados apoiam antes que desmentem a minha tese, tanto revelam superporem-se aos dados iconográficos os índices do misterioso. Ainda que tirados de imediato, um após outro, os retratos sempre serão entre si muito diferentes. E as máscaras, moldadas nos rostos? Valem, grosso modo, para o falquejo das formas, não para o explodir da expressão, o dinamismo fisionômico. 12Não se esqueça, é de fenômenos sutis que estamos tratando.

Resta-lhe argumento: qualquer pessoa pode, a um tempo, ver o rosto de outra e sua reflexão no espelho. O experimento, por sinal ainda não realizado com rigor, careceria de valor científico, em vista das irredutíveis deformações, de ordem psicológica. Além de que a simultaneidade torna-se impossível, no fluir de valores instantâneos. Ah, o tempo é o mágico de todas as traições... E os próprios 9olhos, de cada um de nós, padecem viciação de origem, defeitos com que cresceram e a que se afizeram, mais e mais. Os 10olhos, por enquanto, são a porta do engano; duvide deles, dos seus, não de mim. Ah, meu amigo, a espécie humana peleja para impor ao latejante mundo um pouco de rotina e lógica, mas algo ou alguém de tudo faz brecha para rir-se da gente...

Vejo que começa a descontar um pouco de sua inicial desconfiança quanto ao meu são juízo. Fiquemos, porém, no terra a terra. Rimo-nos, nas barracas de diversões, daqueles caricatos espelhos, que nos reduzem a mostrengos, esticados ou globosos. Mas, se só usamos os planos, deve-se a que primeiro a humanidade mirou-se 2nas 11superfícies de água quieta, lagoas, fontes, delas aprendendo a fazer tais utensílios de metal ou cristal. Tirésias, contudo, já havia predito ao belo Narciso que ele viveria apenas enquanto a si mesmo não se visse...

Sim, são para se ter medo, os espelhos...

João Guimarães Rosa. O espelho. In: Primeiras estórias. Ficção completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994, v. 2, p. 437-55 (com adaptações).


5. (Unb 2012)  Com referência ao texto O espelho, e a questões por ele suscitadas, julgue os itens a seguir.

a) No fragmento de texto apresentado, extraído de um conto de Guimarães Rosa, o estilo de composição diverge esteticamente do verificado na obra-prima do autor, Grande Sertão: Veredas, caracterizada pelo regionalismo pitoresco e folclórico, avesso a reflexões filosóficas, transcendentes ou existenciais.
b) Na estrutura “do qual lhe dão imagem fiel” (ref. 3), a expressão “imagem fiel”, em termos semânticos, é a informação nova do período, tendo em vista que os elementos “do qual”, “lhe” e “dão” retomam, respectivamente, referência em constituintes sintáticos anteriores, a saber: “aspecto próprio e praticamente inalterado” (ref. 4); “o senhor” (ref. 5); e “todos” (ref. 6), sujeito da oração.
c) Levando em consideração o texto em seu nível semântico e, ainda, o que o narrador postula acerca da reflexão de imagens em espelho plano, os vocábulos “fotografias” (ref. 7), “lentes” (ref. 8), “olhos” (ref. 9 e 10), bem como a expressão “superfícies de água quieta” (ref. 11) e os correlatos, formariam um conjunto lexical e semântico cujo traço unificador evidenciaria, na ótica do narrador, uma simplificação da realidade operada pela visão e pelo cérebro.
d) As estruturas “Não se esqueça, é de fenômenos sutis que estamos tratando” (ref. 12) e Não se esqueça, estamos tratando de fenômenos sutis são análogas no que se refere aos constituintes sintáticos, mas se distinguem quanto a efeitos discursivos: a primeira, mas não a segunda, evidencia efeitos obtidos pela focalização de complemento verbal.


Resposta:

a) Incorreto.
b) Correto.
c) Correto.
d) Correto.

Todos os itens apresentam afirmações corretas, exceto [A]. As narrativas de Guimarães Rosa transformam o enredo numa espécie de labirinto, cuja travessia pode ser interpretada como uma metáfora da vida e da própria existência. 




TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
Muita gente considera o catch um esporte ignóbil. O catch não é um esporte, é um espetáculo, e é tão ignóbil assistir a uma representação da dor, no catch, como ao sofrimento de Arnolfo ou de Andrômaca.

Existe, no entanto, um falso catch, pomposo, com a aparência inútil de um esporte regular; mas esse não tem qualquer interesse. O verdadeiro — impropriamente chamado catch amador — realiza-se em salas de segunda classe, onde o público adere espontaneamente à natureza espetacular do combate, como o público de um cinema de bairro. Ao público pouco importa que o combate seja falseado ou não; o futuro racional do combate não lhe interessa: o catch é uma soma de espetáculos, 1sem que um só seja uma função: cada momento impõe o conhecimento total de uma paixão que surge, sem jamais se estender em direção a um resultado que a coroe.

Assim, a função do lutador não é ganhar, mas executar exatamente 2os gestos que se esperam dele. O catch propõe gestos excessivos, explorados até o paroxismo da sua significação. Esta função de ênfase é a mesma do teatro antigo, cuja força — língua — e cujos acessórios — máscaras e coturnos — concorriam para fornecer a explicação exageradamente visível de uma necessidade. O gesto de um lutador vencido, significando uma derrota que não se oculta, mas se acentua, corresponde à máscara antiga, encarregada de significar o tom trágico do espetáculo. O lutador prolonga exageradamente a sua posição de derrota, caído, impondo ao público o espetáculo intolerável da sua impotência. No catch, como nos teatros antigos, não se tem vergonha da dor, sabe-se chorar, saboreiam-se as lágrimas.

Roland Barthes. Mitologias. Rio de Janeiro: DIFEL, 2010, p. 15-26 (com adaptações).


6. (Unb 2012)  Considerando o texto acima e aspectos a ele relacionados, julgue os itens a seguir.

a) Na oração concessiva “sem que um só seja uma função” (ref. 1), há elipse do núcleo nominal do sujeito da oração.
b) Seriam mantidas a correção gramatical e a interpretação original do texto, se o trecho “os gestos que se esperam dele” (ref. 2) fosse reescrito como os gestos lhe são esperados.
c) Os dois primeiros períodos do texto continuariam corretos e coerentes com o texto se fossem parafraseados do seguinte modo: Embora seja considerado um esporte ignóbil, o catch é um espetáculo tanto quanto outros em que há representação da dor, o que invalida característica que muitos lhe atribuem.


Resposta:

a) Correto.
b) Incorreto.
c) Correto.

Apenas é incorreto o que se afirma em [B], pois a transformação da oração na voz ativa (“que se esperam dele”) em outra de sentido equivalente na voz passiva só seria adequada se se inserisse o pronome relativo “que” com função de sujeito: que dele são esperados.




TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
TEXTO 1:

No começo de seu Mercury; Ou: O Mensageiro Secreto e Rápido (1641), John Wilkins conta a seguinte história:

O quanto 1essa Arte de escrever pareceu estranha quando da sua Invenção primeira é algo que podemos imaginar pelos Americanos recém-descobertos, que ficaram espantados ao ver Homens conversarem com Livros, e não conseguiam acreditar que um Papel pudesse falar...
Há um relato excelente a esse Propósito, referente a um Escravo Índio; que, ao ser mandado por seu Senhor com uma Cesta de Figos e uma Carta, comeu durante o Percurso uma grande Parte de seu Carregamento, entregando o Restante à Pessoa a quem se destinava; que, ao ler a Carta e não encontrando a Quantidade de Figos correspondente ao que se tinha dito, acusa o Escravo de comê-los, dizendo que a Carta afirmava aquilo contra ele. Mas o Índio (apesar dessa Prova) negou o Fato, acusando o Papel de ser uma Testemunha falsa e mentirosa.
Depois disso, sendo mandado de novo com um Carregamento semelhante e uma Carta expressando o Número exato de Figos que deviam ser entregues, ele, mais uma vez, de acordo com sua Prática anterior, devorou uma grande Parte deles durante o Percurso; mas, antes de comer o primeiro (para evitar as Acusações que se seguiriam), pegou a Carta e a escondeu sob uma grande Pedra, assegurando-se de que, se ela não o visse comer os Figos, nunca poderia acusá-lo; mas, sendo agora acusado com muito mais rigor do que antes, confessou a Falta, admirando a Divindade do Papel e, para o futuro, promete realmente toda a sua Fidelidade em cada Tarefa.
Poder-se-ia dizer que um texto, depois de separado de seu autor (assim como da intenção do autor) e das circunstâncias concretas de sua criação (e, consequentemente de seu referente intencionado), flutua (por assim dizer) no vácuo de um leque potencialmente infinito de interpretações possíveis. Wilkins poderia ter objetado que, no seu relato, o senhor tinha certeza de que a cesta mencionada na carta era a mesma levada pelo escravo, que o escravo que a levara era exatamente o mesmo a quem seu amigo dera a cesta, e que havia uma relação entre a expressão “30” escrita na carta e o número de figos contidos na cesta. Naturalmente, bastaria imaginar que, ao longo do caminho, o escravo original fora assassinado e outra pessoa o substituíra, que os trinta figos originais tinham sido substituídos por outros figos, que a cesta foi levada a um destinatário diferente, que o novo destinatário não sabia de nenhum amigo ansioso por lhe mandar figos. Mesmo assim seria possível concluir o que a carta estava dizendo? Entretanto, temos o direito de supor que a reação do novo destinatário seria algo do tipo: “Alguém, e Deus sabe quem, mandou-me uma quantidade de figos menor do que o número mencionado na carta que os acompanha.” Vamos supor agora que não apenas o mensageiro tivesse sido morto, como também que seus assassinos tivessem comido todos os figos, destruído a cesta, colocado a carta numa garrafa e a tivessem jogado no oceano, de modo que fosse encontrada setenta anos depois por Robinson Crusoé. Não havia cesta, nem escravo, nem figos, só uma carta. Apesar disso, aposto que a primeira reação de Robinson Crusoé teria sido: “Onde estão os figos?”

[Adaptado de ECO, Umberto. Interpretação e superinterpretação.
São Paulo: Martins Fontes, 2001, p. 47-49]


7. (Pucrj 2010)  a) O pronome demonstrativo essa, logo no início da passagem de John Wilkins (ref. 1), tem função anafórica, isto é, faz referência a um conteúdo textual anterior. A que conteúdo anterior podemos inferir que o pronome se refere nesse caso?
b) Na passagem de Wilkins, escrita em 1641, adota-se uma convenção ortográfica distinta da nossa no que diz respeito ao uso de letras maiúsculas. Explicite a diferença.
c) O verbo ser tem o mesmo comportamento sintático em todas as frases abaixo, exceto em uma delas.

Indique-a e explique a diferença.
(I) Talvez a carta fosse encontrada setenta anos depois por Robinson Crusoé.
(II) A carta expressava o número exato de Figos que deviam ser entregues.
(III) Vamos supor que o mensageiro tivesse sido morto.
(IV) O escravo afirmou que o papel era uma testemunha falsa e mentirosa.
(V) O escravo foi mandado àquele destino com uma Cesta de Figos e uma carta.


Resposta:

a) Pode-se inferir que o pronome essa retoma anaforicamente um conteúdo textual anterior referente ao advento da língua escrita.
b) No texto de Wilkins, iniciam-se com letras maiúsculas os substantivos comuns, ao passo que, em nossa convenção ortográfica, aplica-se a inicial maiúscula apenas aos substantivos próprios, salvo em casos excepcionais.
c) Em todos os casos, exceto em (IV), ser funciona como verbo auxiliar em construções na voz passiva. No caso (IV), ser funciona como verbo de ligação em um predicado nominal que tem como núcleo uma testemunha falsa e mentirosa.



  
8. (Puc-rio 2008)  TEXTO I

            ESQUECER ALGUMAS COISAS FACILITA LEMBRAR OUTRAS

            Esquecer uma informação menos importante, mediante um processo de memória seletiva, torna mais fácil lembrar um dado mais relevante, segundo um estudo elaborado por cientistas dos Estados Unidos. Para chegar a esta conclusão, que a revista científica britânica "Nature Neuroscience" traz em sua última edição, os especialistas fizeram ressonâncias magnéticas em indivíduos enquanto estes tentavam lembrar associações de palavras que tinham aprendido anteriormente.
            Durante os exames, os cientistas analisaram o comportamento do córtex pré-frontal, a parte do cérebro que participa do processo de recuperação das informações armazenadas na memória. Como se fosse uma competição em que uma informação vence quando outra é descartada, quanto maior o número de coisas que os pesquisados esqueciam, menos ativo o córtex pré-frontal se mostrava, isto é, menos recursos o cérebro precisava usar para recuperar uma informação. Portanto, para os indivíduos que participaram da experiência, foi muito mais simples lembrar uma associação de palavras ao esquecer outras.
            Adaptado de texto disponível em: Yahoo Notícias, <http://br.noticias.yahoo.com>, 03 de junho de 2007.

TEXTO II

            ESQUECIMENTO DE IMPRESSÕES E CONHECIMENTOS

            Também nas pessoas saudáveis, não neuróticas, encontramos sinais abundantes de que uma resistência se opõe à lembrança de impressões penosas, à representação de pensamentos aflitivos. [...]
             O ponto de vista aqui desenvolvido - de que as lembranças aflitivas sucumbem com especial facilidade ao esquecimento motivado - merece ser aplicado em muitos campos que até hoje lhe concederam muito pouca ou nenhuma atenção. 1Assim, parece-me que ele ainda não foi enfatizado com força suficiente na avaliação dos testemunhos prestados nos tribunais, onde é patente que se considera o juramento da testemunha capaz de exercer uma influência exageradamente purificadora sobre o jogo de suas forças psíquicas. É universalmente reconhecido que, no tocante à origem das tradições e da história legendária de um povo, é preciso levar em conta esse tipo de motivo, cuja meta é apagar da memória tudo o que seja penoso para o sentimento nacional.
            FREUD, Sigmund. Fragmento de "Sobre a psicopatologia da vida cotidiana". Edição "standard" brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud, vol. VI, Tradução dirigida por Jayme Salomão, Rio de Janeiro: Imago, 1996, p. 152-153.

a) Os Textos 1 e 2 tematizam o esquecimento, associando sua ocorrência a fatores distintos. Diga quais são esses fatores e compare-os quanto à sua natureza.
b) No experimento descrito no Texto 1, que relação foi observada entre a menor atividade do córtex pré-frontal e o desempenho dos participantes na tarefa proposta?
c) Leia o período a seguir, extraído do Texto 2 (ref. 1), e retire o termo oracional que exerce a mesma função sintática de "muito divertida" em "O menino achou muito divertida a comédia."

            "Assim, parece-me que ele ainda não foi enfatizado com força suficiente na avaliação dos testemunhos prestados nos tribunais, onde é patente que se considera o juramento da testemunha capaz de exercer uma influência exageradamente purificadora sobre o jogo de suas forças psíquicas."


Resposta:

a) O Texto 1 associa o esquecimento a fatores de natureza neurofisiológica (patologia). O Texto 2 associa o esquecimento a fatores de ordem psicológica, ou seja, com a necessidade de evitar lembranças desagradáveis.

b) A menor atividade foi relacionada a um melhor desempenho dos pesquisados na tarefa experimental que envolveu associações de palavras.

c) O termo oracional que exerce a mesma função sintática da expressão destacada é: "capaz de exercer uma influência exageradamente purificadora sobre o jogo de suas forças psíquicas" (predicativo).



  
9. (Fuvest 2008)  Jornalistas não deveriam fazer previsões, mas as fazem o tempo todo. Raramente se dão ao trabalho de prestar contas quando erram. Quando o fazem não é decerto com a ênfase e o destaque conferidos às poucas previsões que acertam.
            Marcelo Leite, "Folha de S.Paulo".

a) Reescreva o trecho "Jornalistas não deveriam fazer previsões, mas as fazem o tempo todo", iniciando-o com "Embora os jornalistas..."
b) No trecho "Quando O fazem não é decerto com a ênfase (...)", a que ideia se refere o termo destacado?


Resposta:

a) "Embora os jornalistas não devessem fazer previsões, fazem-nas o tempo todo".

b) O pronome oblíquo  "o"  representa a ideia de: "prestar contas quando erram".



  
10. (Ufc 2008)  Leia o texto a seguir e preencha os parênteses com V ou F, conforme seja verdadeiro ou falso o que se afirma sobre ele.

            Asclepíades ainda achou muito que contar sobre a enfermidade; no seu excessivo interesse traía-se a satisfação de um quase triunfo, e toda a sua atenção estava posta na filha, 1CUJOS sentimentos procurava surpreender, através de seu semblante inexpressivo, de seu olhar parado e vago, das palavras triviais 2QUE soltava sem 3UMA REFERÊNCIA DIRETA AO BACHAREL. Como aquela criaturinha 4QUE lhe nascera nos braços, 5QUE lhe crescera no colo, 6DIA A DIA, sempre 7SUBMISSA À SUA VONTADE, sempre solícita em 8OBEDECER-LHE, pudera tornar-se assim 9IMPENETRÁVEL à sua perspicácia de pai, assim 10ABROQUELADA e autônoma em 11SUA vida afetiva, velada por uma discrição calma mas obstinada, inatingível, 12REFRATÁRIA À AÇÃO da sua autoridade!.
            (SALES, Antônio. Aves de Arribação. Fortaleza: Edições UFC, 2006, 137. )

(     ) O pronome relativo CUJOS (ref. 1) estabelece relação de posse entre o termo antecedente [filha] e o subsequente [sentimentos].
(     ) O pronome relativo que (ref. 2) exerce função sintática de objeto direto do verbo soltar em que soltava.
(     ) A substituição de bacharel por Alípio em UMA REFERÊNCIA AO BACHAREL (ref. 3) gramaticalmente faculta a anteposição do artigo definido masculino.
(     ) Atuam como adjuntos adnominais: LHE, em lhe nascera (ref. 5) e LHE em lhe crescera.
(     ) Em linguagem culta formal, recomenda-se empregar obedece-lo ao invés de OBEDECER-LHE (ref. 8), sendo esta última considerada um arcaísmo.
(     ) A expressão DIA A DIA (ref. 6) equivale semanticamente à composta dia; o uso do hífen é uma questão estilística.
(     ) O uso do acento grave em SUBMISSA À SUA VONTADE (ref. 7) é obrigatório, pois submissa exige complemento nominal introduzido por preposição.
(     ) O uso do acento grave em REFRATÁRIA À AÇÃO (ref. 12) manter-se-ia mesmo que a expressão fosse empregada no plural: REFRATÁRIAS ÀS AÇÕES.
(     ) Tanto em IMPENETRÁVEL (ref. 9) quanto em ABROQUELADA (ref. 10) há correspondência biunívoca letra - fonema.
(     ) Remetem a um mesmo referente textual sua em SUA perspicácia e SUA em sua vida afetiva (ref. 11).


Resposta:

(V) - (V) - (V)- (V) - (F) - (F) - (F) - (V) - (F) - (F).




TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
Texto 1

            O material do poeta é a vida, e só a vida, com tudo o que ela tem de sórdido e sublime. Seu instrumento é a palavra. Sua função é a de ser expressão verbal rítmica ao mundo informe de sensações, sentimentos e pressentimentos dos outros com relação a tudo o que existe ou é passível de existência no mundo mágico da imaginação. Seu único dever é fazê-lo da maneira mais bela, simples e comunicativa possível, do contrário ele não será nunca um bom poeta, mas um mero lucubrador* de versos.
(Vinícius de Moraes, Para Viver um Grande Amor, p. 101-102.)

* aquele que compõe com esforço à custa de muita meditação.


Texto 2

Não faças versos sobre acontecimentos.
Não há criação nem morte perante a poesia.
Diante dela, a vida é um sol estático,
não aquece nem ilumina.
As afinidades, os aniversários, os incidentes pessoais não contam.

Nem me reveles teus sentimentos,
que se prevalecem do equívoco e tentam a longa viagem.
O que pensas e sentes, isso ainda não é poesia.

Não recomponhas
tua sepultada e merencória infância.
Não osciles entre o espelho e a
memória em dissipação.
Que se dissipou, não era poesia.
Que se partiu, cristal não era.

Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.

Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível, que lhe deres:
Trouxeste a chave?
(Carlos Drummond de Andrade, Procura da poesia)


11. (Ufscar 2008)  Voltando ao texto em prosa de Vinícius de Moraes e pondo foco no trecho "Seu único dever é fazê-lo da maneira mais bela",
a) A que se refere no texto o pronome "seu"?
b) A que se refere no texto o pronome "lo"?


Resposta:

a) O pronome "seu" (um anafórico) retoma o substantivo "poeta".

b) O pronome "lo" (um anafórico) retoma o ato de escrever poesia para tentar representar "a vida, com tudo o que ela tem de sórdido e sublime". 

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Bons estudos!!

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