segunda-feira, 22 de abril de 2013

Pontuação, regência e tipos de discurso. Questões discursivas com gabarito comentado.






1. (Unicamp 2013)  TEXTO 1

Imagine-se como um estudante de ensino médio de uma escola que organizará um painel sobre características psicológicas e suas implicações no plano individual e na vida em sociedade. Nesse painel, destinado à comunidade escolar, cada texto reproduzido será antecedido por um resumo. Você ficou responsável por elaborar o resumo que apresentará a matéria transcrita abaixo, extraída de uma revista de divulgação científica. Nesse resumo você deverá:

— apresentar o ponto de vista expresso no texto, a respeito da importância do pessimismo em oposição ao otimismo, relacionando esse ponto de vista aos argumentos centrais que o sustentam.

Atenção: uma vez que a matéria será reproduzida integralmente, seu texto deve ser construído sem copiar enunciados da matéria.

PESSIMISMO

Para começar, precisamos de pessimistas por perto. Como diz o psicólogo americano Martin Seligman: “Os visionários, os planejadores, os desenvolvedores, todos eles precisam sonhar com coisas que ainda não existem, explorar fronteiras. Mas, se todas as pessoas forem otimistas, será um desastre”, afirma. Qualquer empresa precisa de figuras que joguem a dura realidade sobre os otimistas: tesoureiros, vice-presidentes financeiros, engenheiros de segurança...

Esse realismo é coisa pequena se comparado com o pessimismo do filósofo alemão Arthur Schopenhauer (1788-1860). Para ele, o otimismo é a causa de todo o sofrimento existencial. Somos movidos pela vontade – um sentimento que nos leva a agir, assumir riscos e conquistar objetivos. Mas essa vontade é apenas uma parte de um ciclo inescapável de desilusões: dela vamos ao sucesso, então à frustração – e a uma nova vontade.

Mas qual é o remédio, então? Se livrar das vontades e passar o resto da vida na cama sem produzir mais nada? Claro que não. A filosofia do alemão não foi produzida para ser levada ao pé da letra. Mas essa visão seca joga luz no outro lado da moeda do pessimismo: o excesso de otimismo – propagandeado nas últimas décadas por toneladas de livros de autoajuda. O segredo por trás do otimismo exacerbado, do pensamento positivo desvairado, não tem nada de glorioso: ele é uma fonte de ansiedade. É o que concluíram os psicólogos John Lee e Joane Wood, da Universidade de Waterloo, no Canadá. Um estudo deles mostrou que pacientes com autoestima baixa tendem a piorar ainda mais quando são obrigados a pensar positivamente.

Na prática: é como se, ao repetir para si mesmo que você vai conseguir uma promoção no trabalho, por exemplo, isso só servisse para lembrar o quanto você está distante disso. A conclusão dos pesquisadores é que o melhor caminho é entender as razões do seu pessimismo e aí sim tomar providências. E que o pior é enterrar os pensamentos negativos sob uma camada de otimismo artificial. O filósofo britânico Roger Scruton vai além disso. Para ele, há algo pior do que o otimismo puro e simples: o “otimismo inescrupuloso”. Aquelas utopias* que levam populações inteiras a aceitar falácias** e resistir à razão. O maior exemplo disso foi a ascensão do nazismo – um regime terrível, mas essencialmente otimista, tanto que deu origem à Segunda Guerra com a certeza inabalável da vitória. E qual a resposta de Scruton para esse otimismo inescrupuloso? O pessimismo, que, segundo ele, cria leis preparadas para os piores cenários. O melhor jeito de evitar o pior, enfim, é antever o pior.

(Extraído de M. Horta, “O lado bom das coisas ruins”, em Superinteressante, São Paulo, nº 302, março 2012. http://super.abril.com.br/cotidiano/lado-bom-coisas-ruins-68705.shtml. Acessado em 2/09/2012.)

* Utopia: projeto de natureza irrealizável; ideia generosa, porém impraticável; quimera; fantasia.
** Falácia: qualquer enunciado ou raciocínio falso que, entretanto, simula a veracidade; raciocínio verossímil, porém falso; engano; trapaça.


TEXTO 2

Imagine que, ao ler a matéria “Cães vão tomar uma ‘gelada’ com cerveja pet”, você se sente incomodado por não haver nela nenhuma alusão aos possíveis efeitos que esse tipo de produto pode ter sobre o consumo de álcool, especialmente por adolescentes. Como leitor assíduo, você vem acompanhando o debate sobre o álcool na adolescência e decide escrever uma carta para a seção Leitor do jornal, criticando a matéria por não mencionar o problema do aumento do consumo de álcool.
Nessa carta, dirigida aos redatores do jornal, você deverá:

— fazer menção à matéria publicada, de modo que mesmo quem não a tenha lido entenda a importância da crítica que você faz;
— fundamentar a sua crítica com dados apresentados na matéria “Vergonha Nacional”, reproduzidos adiante.

Atenção: ao assinar a carta, use apenas as iniciais do remetente.

Cães vão tomar uma “gelada” com cerveja pet
Produto feito especialmente para cachorros chega ao mercado nacional em agosto

Nada é melhor que uma cervejinha depois de um dia de cão.
Agora eles, os cães, também vão poder fazer jus a essa máxima. No mês de agosto chega ao mercado a Dog Beer, cerveja criada especialmente para os amigos de quatro patas. “Quem tem bicho de estimação gosta de dividir o prazer até na hora de comer e beber”, aposta o empresário M. M., 47, dono da marca.
Para comemorar a final da Libertadores, a executiva A. P. C., 40, corintiana roxa, quis inserir Manolito, seu labrador, na festa.
“Ele tomou tudo. A cerveja é docinha, com fundinho de carne”, descreve.
Uniformizado, Manolito não só bebeu a gelada durante o jogo contra o Boca Juniors como latiu sem parar até o fim da partida.
Desenvolvida pelo centro de tecnologia e formação de cervejeiros do Senai, no Rio de Janeiro, a bebida canina é feita à base de malte e extrato de carne; não tem álcool, lúpulo, nem gás carbônico.
O dono da empresa promete uma linha completa de “petiscos líquidos”, que inclui suco, vinho e champanhe.
A lista de produtos humanos em versões animais não para de crescer.
Já existem molhos, tempero para ração e até patê.
O sorvete Ice Pet é uma boa opção para o verão. A sobremesa tem menos lactose, não tem gorduras nem açúcar.

(Adaptado de Ricardo Bunduky, Folha de São Paulo, São Paulo, 22 julh.2012, Cotidiano 3 p.)


Vergonha Nacional

As décadas de descumprimento da lei (...) contribuíram para que os adultos se habituassem a ver o consumo de bebidas entre adolescentes como “mal menor”, comparado aos perigos do mundo. (...) Um estudo publicado pela revista Drugs and Alcohol Dependence ouviu 15.000 jovens nas 27 capitais brasileiras. O cenário que emerge do estudo é alarmante. Ao longo de um ano, um em cada três jovens brasileiros de 14 a 17 anos se embebedou ao menos uma vez. Em 54% dos casos mais recentes, isso ocorreu na sua casa ou na de amigos ou parentes. Os números confirmam também a leniência com que os adultos encaram a transgressão. Em 17% dos episódios, os menores estavam acompanhados dos próprios pais ou de tios.

Resultados da pesquisa realizada com 15.000 jovens de 14 a 17 anos nas 27 capitais brasileiras

Quantas vezes se embebedou

Onde ficou embriagado
(na última vez em que bebeu)

Com quem bebeu
(na última vez em que bebeu)
Nenhuma vez
12%

Bar
35%

Amigos
50%
Uma vez na vida
35%

Casa de amigos
30%

Irmãos e primos
26%
Ao menos uma vez no último ano
32%

Casa de parentes
13%

Pais ou tios
17%
Ao menos uma vez no último mês
21%

Própria casa
11%

Namorado
5%



Festas ou praia
11%

Sozinho
2%

(Adaptado de Revista Veja, Editora Abril, São Paulo, no 28, 11 julh. 2012, p. 81-82.)  


Resposta:

Texto 1

O resumo do texto “O lado bom das coisas ruins” a ser apresentado num painel destinado à comunidade escolar deve apresentar sucintamente o ponto de vista da matéria sobre a importância de uma postura pessimista face à realidade, ou de um comportamento equilibrado que, mesmo levando em consideração fatores otimistas, mostrasse a relevância de encarar as situações e os acontecimentos também pelo aspecto negativo. A tese defendida por Martin Seligman alerta para a necessidade de adequar as utopias ou os devaneios à realidade das circunstâncias, coadunando-se à filosofia schopenhaueriana que considerava o otimismo o causador de todo o sofrimento existencial. Contrariamente ao que é propagandeado em livros de autoajuda, o esforço para se atingir resultados positivos provoca ansiedade e pode gerar sentimento de insatisfação diante do fracasso dos resultados esperados. Nesse sentido, o pessimismo adquire relevância não só no comportamento individual, como também no plano ideológico e coletivo em face dos exemplos documentados na História que conduziram a Humanidade a guerras insanas e de consequências trágicas, de que o Nazismo é exemplo irrefutável.

Texto 2

A carta deve seguir os parâmetros da dissertação argumentativa: introdução com o ponto de vista a ser defendido, desenvolvimento com argumentos que sustentem a tese e, finalmente, o fecho, seguido de uma expressão que preceda a assinatura com as iniciais do remetente. Ou seja, torna-se imprescindível a menção de local e data, destinatário, saudação, interlocução com o destinatário e despedida. O interlocutor, mencionado no cabeçalho e no vocativo que antecede o primeiro parágrafo, deve ser evocado também no decorrer do texto através de verbos no imperativo, com linguagem adequada ao grau de intimidade entre emissor e receptor. No caso, para atender à solicitação do enunciado, a carta deve ser dirigida aos redatores do jornal Folha de São Paulo a fim de expressar a indignação do leitor que, após ler a matéria sobre o lançamento no mercado de um tipo de cerveja para cães, não se conforma com o descaso com que é tratado o problema do consumo de álcool, já que a notícia não vem acompanhada de nenhuma advertência relativamente aos efeitos dos excessos cometidos, sobretudo entre adolescentes. Apesar de o produto anunciado não ter álcool na sua composição, pode funcionar como um incentivo ao consumo de bebidas alcoólicas, pois os animais habitam o mesmo espaço onde, segundo a pesquisa inclusa no artigo “Vergonha nacional” da revista “Veja”, os adolescentes costumam desenvolver o hábito. Em mais de 50% dos casos analisados, o fato acontece em casa ou na de amigos ou parentes e, em 17% dos episódios, na companhia de amigos e familiares que minimizam a gravidade da atitude, contribuindo assim para o desenvolvimento do vício.  



  
2. (Pucrj 2013)  REDAÇÃO

O sociólogo Octavio Ianni (1926-2004), em trecho reproduzido no texto 1 desta prova, afirma o seguinte: “A história dos povos está atravessada pela viagem, como realidade ou metáfora. Todas as formas de sociedade, compreendendo tribos e clãs, nações e nacionalidades, colônias e impérios, trabalham e retrabalham a viagem, seja como modo de descobrir o ‘outro’, seja como modo de descobrir o ‘eu’’’.
Produza um texto dissertativo-argumentativo – claro, coerente e bem fundamentado –, no qual você apresente um ponto de vista sobre uma história – do noticiário, da tradição oral, da História Geral ou de ficção (parte de um filme, romance, conto, crônica, etc.) – que tenha como foco uma viagem. Você deverá, em cerca de 25 linhas, apresentar a história – colocando seus referentes completos –, e analisá-la à luz da mencionada citação de Ianni.
A seleção de textos a seguir tem por objetivo ajudá-lo a desenvolver suas próprias ideias a respeito da questão abordada. Alguns desses textos podem ser reproduzidos, em parte, na sua produção textual – assim como os demais constantes desta prova –, mas em forma de DISCURSO INDIRETO ou PARÁFRASE, com as devidas fontes mencionadas na redação. Coloque um título em seu texto. NÃO ASSINE.

Texto 1
O que não é uma viagem? Por menos que se dê um sentido figurado a esse termo – e jamais pudemos deixar de fazê-lo – a viagem coincide com a vida, nem mais, nem menos: o que é esta, além de uma passagem do nascimento à morte? O deslocamento no espaço é o indício primeiro, o mais óbvio, da mudança; ora, quem diz, diz mudança. O relato também se alimenta da mudança; nesse sentido, viagem e relato aplicam-se mutuamente. A viagem no espaço simboliza a passagem do tempo, o deslocamento físico o faz para a mudança interior; tudo é viagem, mas trata-se de um tudo sem identidade. A viagem transcende todas as categorias, incluindo a da mudança, do mesmo e do outro, pois desde a mais remota Antiguidade são acumuladas viagens de descobrimento, explorações do desconhecido, e viagens de regresso, reapropriação do familiar: os argonautas são grandes viajantes, mas Ulisses também o é.
[...] podemos, com um pouco mais de probabilidade de êxito, tentar distinguir, no próprio interior desse magma imenso, vários tipos de viagem, ou talvez várias categorias que permitem caracterizar as viagens particulares. A oposição mais comum, e que se impõe primeiramente, é a dos planos espiritual e material, ou, se preferirmos, do interior e do exterior. Tomemos dois exemplos célebres de relatos medievais: a Viagem de ultramar, de Mandeville, e A busca do Santo Graal. O primeiro descreve duas viagens (compostas de elementos reais e imaginários; mas podemos deixar essa distinção de lado, por enquanto), na Terra Santa e no Extremo-Oriente, lugares onde o autor descobre, para grande prazer de seus leitores, todas as espécies de seres maravilhosos, e ainda por cima o próprio Paraíso terrestre! O segundo descreve as aventuras dos cavaleiros da Távola Redonda, da corte do rei Artur, que partem em busca de um objeto misterioso e sagrado, o Graal; mas pouco a pouco esses cavaleiros descobrem que a busca em que estão envolvidos é de natureza espiritual, e que o Graal é uma entidade impalpável; por isso só os mais puros, Galaad e Perceval, podem alcançá-lo [...].

Fragmento de artigo do filósofo Tzvetan Todorov, “Le voyage et son récit”, publicado em: Les morales de l’histoire (TODOROV, 1995). Tradução de Lea Mara Valezi Staut – publicação original no volume 39 (1999) da Revista de Letras. Rev. Let., São Paulo, v.46, n.1, p.231-244, jan./jun. 2006.

Texto 2
Entre os inúmeros narradores anônimos, dois grupos se interpenetram de múltiplas maneiras. [...] Quando alguém faz uma viagem, então tem alguma coisa para contar, diz a voz do povo e imagina o narrador como alguém que vem de longe. Mas não é com menos prazer que se ouve aquele que, vivendo honestamente do seu trabalho, ficou em casa e conhece as histórias e tradições de sua terra. Se se quer presentificar esses dois grupos nos seus representantes arcaicos, então um está encarnado no lavrador sedentário e o outro no marinheiro mercante.

Fragmento retirado do texto “O narrador” (1936), de Walter Benjamin (1892-1940). In: Os pensadores, nº 8 – Textos escolhidos: Benjamin, Horkheimer, Adorno, Habermas. 2ª ed.Trad.: José Lino Grunnewald et al. São Paulo: Abril Cultural, 1983; p.58.

Texto 3
[...] O viajante vai sempre optar por não viver onde estiver morando. Para ele, não estar em casa significa estar mais em casa do que em qualquer outro local. A busca de um lugar passa pela recusa de ter um lugar. Para se encontrar, ele tem de ir embora e não morar em lugar nenhum. [...] Incapazes de levar uma vida sedentária numa cidade qualquer, eles estão sempre na estrada. [...] Viajar, aqui, não é uma forma de chegar a algum lugar, mas de deixar para trás tudo aquilo que torna a vida insuportável. Estar em movimento é uma espécie de estado de suspensão. [...]

Fragmento retirado do capítulo “O viajante”, do livro Cenários em ruínas, de Nélson Brissac Peixoto. São Paulo: Brasiliense, 1987; p. 82-85.

Texto 4
Compreendemos, portanto, que as viagens sejam sempre experiências de estranhamento. E podemos mesmo observar que está, talvez, neste efeito de distanciamento, no sentimento de dépaysement (termo forjado com tanta felicidade pela língua francesa, cuja significação se aproximaria do nosso termo “desterro”, se tomássemos num registro exclusivamente psicológico e simbólico) que, de um modo ou de outro, sempre envolve o viajante (que não se mostra inabalavelmente frívolo), o seu núcleo essencial e sua expressão mais íntima.

Fragmento do artigo “O olhar do viajante”, de Sérgio Cardoso. In: NOVAES, Adauto. O olhar. São Paulo: Companhia das Letras, 1988, p.359.


Resposta:

Segundo os parâmetros estabelecidos no enunciado, o texto dissertativo deve apresentar ponto de vista fundamentado em uma história, cujo enredo focalize uma viagem em que o personagem viajante expresse uma busca de cunho existencial, à luz das considerações de Octavio Ianni. Segundo ele, a narrativa histórica configura uma metáfora: tentativa de descoberta de si mesmo ou do outro. A coletânea que acompanha a proposta reúne textos de teor filosófico que discorrem sobre o assunto e auxiliam a delimitar o tema. O texto 1 associa viagem à própria vida, no sentido do percurso que intermedeia nascimento e morte. Para Tzvetan Todorov, o relato transcende assim a descrição da viagem no sentido de revelar que a mudança espacial ou temporal se associa à busca do material ou do metafísico. O texto 2 discorre sobre a narrativa de comunicação oral, reproduzida por autores anônimos que nunca saíram do seu espaço, mas “viajam” no tempo ao relatar causos e fatos que fazem parte da sua história e contribuem para a formação da identidade cultural do grupo. No texto 3, Nélson Brissac define o viajante como a pessoa que vive uma eterna fuga a uma sociedade opressiva ou limitadora, numa tentativa incessante de encontrar o lugar ideal que evidentemente nunca encontra, gerando a sensação constante de incompletude. No último texto, o ator Sérgio Cardoso discorre sobre a subjetividade e a parcialidade do “viajante” ao representar preferencialmente o que lhe provoca sensação de estranhamento. Ou seja, o narrador revela nos seus relatos não só o que vê, mas também o que atende à sua subjetividade e o separa do outro: o maravilhoso ou o exótico. Para atender às orientações da proposta, a tese deveria basear-se em uma história (do noticiário, da tradição oral, da História Geral ou de ficção) que tenha como foco uma viagem, mencionando as referidas fontes. Algumas leituras desenvolvidas no período de formação escolar ou outras que fazem parte da cultura universal ajudariam a delimitar o tema, como “Os Lusíadas”, de Luís de Camões, “Viagens de Gulliver”, de Swift,“A volta ao mundo em 80 dias”, de Julio Verne , “Macunaíma” de Mário de Andrade, o poema “Navio negreiro” de Castro Alves e a própria literatura de cordel tão representativa da cultura popular brasileira. Também o cinema forneceria subsídios para exploração do assunto. Filmes como “A ilha misteriosa” e “De volta para o futuro” revelaram-se sucesso de bilheteria para um público ávido de paisagens exóticas e fantásticas, assim como “Além da natureza selvagem” para o que divide com o personagem a sensação de opressão da civilização moderna. Ou ainda “Planeta dos macacos” que, por apresentar humanos como seres incapazes de controlar as suas mentes a ponto de destruir a vida na Terra, conduz à reflexão sobre os limites a que a humanidade se deve impor para a preservação da espécie e do próprio planeta. A conclusão deve conter a síntese de tudo o que foi apresentado no texto, retomando o que foi apresentado na introdução e/ou no desenvolvimento de forma coerente. 



  
3. (Pucrj 2013)  REDAÇÃO

Segundo a escritora Susan Sontag (1933-2004), a sanidade é uma “mentira aconchegante’. Realmente, é costume dizer que há uma linha tênue entre sanidade e loucura. Com base nesse enquadramento do tema, produza um texto dissertativo-argumentativo – claro, coerente e bem fundamentado – acerca da loucura como forma poética de visão, de vivência e de contestação do mundo. Você deverá, em cerca de 25 linhas, contextualizar o tema, explicar posições e manifestar seu ponto de vista. A seleção de textos a seguir tem por objetivo ajudá-lo a desenvolver suas próprias ideias a respeito da questão abordada. Alguns desses textos podem ser reproduzidos, em parte, na sua produção textual – assim como os demais constantes desta prova –, mas em forma de DISCURSO INDIRETO ou PARÁFRASE, com as devidas fontes mencionadas na redação. Coloque um título em seu texto. NÃO ASSINE.

Texto 1
Regressamos assim à imaginação. A essa louca por vezes fascinante e por vezes furiosa que mora no sótão. Ser romancista é conviver felizmente com a louca lá de cima. É não ter medo de visitar todos os mundos possíveis e alguns impossíveis. Tenho outra teoria (tenho muitas: resultado da frenética laboriosidade da minha razão), segundo a qual os narradores somos seres mais dissociados ou talvez mais conscientes da dissociação que os outros. Isto é, sabemos que dentro de nós somos muitos. Há profissões que combinam melhor que outras com este tipo de caráter, como, por exemplo, ser ator ou atriz. Ou ser espião. Mas para mim não há nada que se compare com ser romancista, porque isto nos permite não apenas viver outras vidas, mas também inventá-las. “Às vezes tenho a impressão de que surjo do que escrevi tal como uma serpente surge da sua pele”, diz Vila-Matas em A viagem vertical. O romance é a autorização da esquizofrenia.
Um dia do mês de novembro último eu estava dirigindo por Madri; era mais ou menos hora do almoço e lembro que ia a um restaurante me encontrar com uns amigos. Era um desses dias típicos do inverno madrileno, frios e intensamente luminosos, com ar limpo e escarchado e um céu esmaltado de laca azul brilhante. Estava na Modesto Lafuente ou em alguma das ruas paralelas, vias estreitas e com obrigação de dar passagem nas esquinas, nas quais não se pode andar a mais de quarenta ou cinquenta por hora. Assim, indo devagar, passei ao lado de um edifício antigo de dois ou três andares em que nunca havia reparado. Em cima da porta, um letreiro metálico dizia: CENTRO DE SAÚDE MENTAL. Devia pertencer a algum organismo público, porque mais acima havia um mastro branco com uma bandeira espanhola se agitando ao vento. Eu passava em frente a esse lugar, enfim, quando de repente, sem que eu pretendesse nem previsse, uma parte de mim se separou e entrou no edifício transformada num paciente que vinha se internar. E num fulminante e intensíssimo instante esse outro eu viveu de tudo: subiu, quer dizer, subi os dois ou três degraus da entrada, com os olhos feridos pelo reflexo da fachada e escutando o furioso flamejar da bandeira, sonoro, abominável e atordoante; e segui para o interior, com o coração tremendo porque sabia que era para ficar, e lá dentro tudo era penumbra repentina, e um silêncio algodoento e irreal, e cheiro de cloro e naftalina, e uma lufada de calor insano nas bochechas. Aquela pequena projeção de mim ficou ali, no Centro de Saúde Mental, às minhas costas, enquanto eu continuava pelas ruas na minha picape rumo ao almoço, pensando em alguma futilidade, tranquila e impassível após aquele espasmo de visão angustiosa que caiu sobre mim como uma gota d’água. Mas, sem nenhuma dúvida, agora já sei como é internar-se num centro psiquiátrico; agora vivi isso, e se algum dia tiver que descrever num livro, saberei fazê-lo, porque uma parte de mim esteve lá e talvez ainda esteja. Ser romancista consiste exatamente nisso. Não creio que possa ser capaz de explicá-lo melhor.

Fragmento do livro A louca da casa, de Rosa Montero. Rio de Janeiro: Ediouro, 2004. p. 21-23.

Texto 2
Dizem que sou louco/ Por pensar assim/ Se eu sou muito louco/ Por eu ser feliz/ Mais louco é quem me diz/ Que não é feliz, não é feliz// Se eles são bonitos/ Sou Alain Delon,/ Se eles são famosos/ Sou Napoleão/ Mais louco é quem me diz/ Que não é feliz, não é feliz// Eu juro que é melhor/ Não ser um normal/ Se eu posso pensar/ Que Deus sou eu// Se eles têm três carros/ Eu posso voar/ Se eles rezam muito/ Eu já estou no céu/ Mais louco é quem me diz/ Que não é feliz/ Não é feliz// Sim, sou muito louco/ Não vou me curar/ Já não sou o único/ Que encontrou a paz/ Mais louco é quem me diz/ E não é feliz/ Eu sou feliz.

Balada do Louco. Composição de Arnaldo Baptista e Rita Lee. Disponível em: <http://www.letras.com.br>. Acesso em: 24 set. 2012.
Texto 3
Nádia Timm: A senhora sempre admite que a loucura une toda sua obra. “Loucura” sintetiza sensibilidade, percepção, forma de expressão diferente do convencional?
Hilda Hilst: É tudo isso, sim, mas também é um desequilíbrio total, um desarranjo. É horrível ser louco. Meu pai foi esquizofrênico paranoico e ele sofreu muito. As pessoas fantasiam muito com a loucura, ficam imaginando só um lado poético, genial de ser louco. Mas não é só isso. Padecer de loucura é terrivelmente doloroso. E não sei até onde a loucura garante a boa qualidade de sensibilidade ou percepção de alguém. O mundo teve loucos geniais, como Nietszche, Nijinsky e tantos outros. Mas teve os horríveis. [...] E também deve ter muito louco chato, maluco mesmo, como acontece com todo o mundo.

Fragmento de entrevista com a escritora Hilda Hilst (1930-2004), feita por Nadia Timm, em 2002, para o site Cyber Goíás (<http://www.cybergoias.com>).


Resposta:

O texto dissertativo-argumentativo deve apresentar uma opinião fundamentada sobre a loucura como forma poética de visão, de vivência e de contestação do mundo. A leitura dos textos que fazem parte da coletânea contribui para elaboração da tese e construção de argumentos que a fundamentem, visando a uma conclusão coerente. No entanto, esses textos não devem ser reproduzidos integralmente na redação, apenas citados, em forma de discurso indireto ou paráfrase, com as devidas fontes mencionadas. No texto 1, Rosa Monteiro vale-se do relato de uma experiência pessoal como exemplo da interferência da imaginação na construção da técnica narrativa. A imagem de uma placa que assinalava um hospital psiquiátrico provoca a imaginação, transportando-a para o interior a ponto de se julgar capaz de descrever as sensações do paciente que para ali seria levado. Assim, associa a arte de escrever à capacidade do artista para criar mundos possíveis e impossíveis, assumir as vivências dos diversos “eus” que constituem a sua própria personalidade ou até mesmo inventá-los se assim o quiser. A composição “Balada do louco” alude ao caráter transgressor da loucura associado muitas vezes à arte moderna, pois ambas se inscrevem como espaço privilegiado de manifestação da subjetividade e liberdade irrestrita, que, segundo o autor, é sinônimo de felicidade. Desta forma, os juízos de valor e as convenções mostram-se sem sentido, na convicção de que, parafraseando Raul Seixas, o artista louco jamais comete a loucura de ser o sujeito normal, desconhecedor da felicidade. No último texto da coletânea, Hilda Hilst contesta a versão de que a loucura reflete apenas a sensibilidade e percepção extraordinárias do artista, representado genericamente como o louco provido de um gênio, imune ao sofrimento dos que convivem com as patologias do desequilíbrio mental. Segundo ela, não é evidente que a loucura seja um atestado de sensibilidade especial de determinada pessoa, nem condição essencial para a criação artística. Assim, e como sugestão, a tese poderia definir o ato criativo como um estado de delírio passageiro e reversível, no qual o artista mergulha quando se distancia circunstancialmente da realidade para voltar a ela quando o quiser, diferente do portador de doença mental que não pode nunca retornar a ele. E se o artista reajusta seu mundo de uma nova maneira, capaz, portanto, de criar um mundo próprio de forma consciente e sadia, também pode construir personagens que apresentam características patológicas: o anti-herói Dom Quixote, de Miguel de Cervantes, o narrador de “Noites na taverna” de Álvares de Azevedo, Simão Bacamarte de “O Alienista” ou Bento Santiago de “Dom Casmurro” através dos quais Machado de Assis faz uma crítica à ciência positivista e apresenta a obsessão provocada pelo ciúme como uma crise de identidade do narrador, criada pela fantasia e pelas imagens delirantes que instauram uma nova realidade.



  
4. (Uerj 2013)  TEXTO I

Tempo: cada vez mais acelerado

Pressa. Ansiedade. E a sensação de que nunca é possível fazer tudo — além da certeza de que sua vida está passando rápido demais. Essas são as principais consequências de vivermos num mundo em que para tudo vale a regra do “quanto mais rápido, melhor”. “Para nós, ocidentais, o tempo é linear e nunca volta. Por isso queremos ter a sensação de que estamos tirando o máximo dele. E a única solução que encontramos é acelerá-lo”, afirma Carl Honoré. “É um equívoco. A resposta a esse dilema é qualidade, não quantidade.”

Para James Gleick, Carl está lutando uma batalha invencível. “A aceleração é uma escolha que fizemos. Somos como crianças descendo uma ladeira de skate. Gostamos da brincadeira, queremos mais velocidade”, diz. O problema é que nem tudo ao nosso redor consegue atender à demanda. Os carros podem estar mais rápidos, mas as viagens demoram cada vez mais por culpa dos congestionamentos. Semáforos vermelhos continuam testando nossa paciência, obrigando-nos a frear a cada quarteirão. Mais sorte têm os pedestres, que podem apertar o botão que aciona o sinal verde — uma ótima opção para despejar a ansiedade, mas com efeito muitas vezes nulo. Em Nova York, esses sistemas estão desligados desde a década de 1980. Mesmo assim, milhares de pessoas o utilizam diariamente.

É um exemplo do que especialistas chamam de “botões de aceleração”. Na teoria, deixam as coisas mais rápidas. Na prática, servem para ser apertados e só. Confesse: que raios fazemos com os dois segundos, no máximo, que economizamos ao acionar aquelas teclas que fecham a porta do elevador? E quem disse que apertá-las, duas, quatro, dez vezes, vai melhorar a eficiência?

Elevadores, aliás, são ícones da pressa em tempos velozes. Os primeiros modelos se moviam a vinte centímetros por segundo. Hoje, o mais veloz sobe doze metros por segundo. E, mesmo acelerando, estão entre os maiores focos de impaciência. Engenheiros são obrigados a desenvolver sistemas para conter nossa irritação, como luzes ou alarmes cuja única função é aplacar a ansiedade da espera. Até onde isso vai?

SÉRGIO GWERCMAN
Adaptado de <super.abril.com.br>.

TEXTO II






TEXTO III

Mestre

Mestre, são 1plácidas
Todas as horas
Que nós perdemos,
Se no perdê-las,
Qual numa jarra,
Nós pomos flores.

Não há tristezas
Nem alegrias
Na nossa vida.
Assim saibamos,
Sábios 2incautos,
Não a viver,

Mas decorrê-la,
Tranquilos, plácidos,
Tendo as crianças
Por nossas mestras,
E os olhos cheios
De Natureza...

À beira-rio,
À beira-estrada,
3Conforme calha,
Sempre no mesmo
Leve descanso
De estar vivendo.

O tempo passa,
Não nos diz nada.
Envelhecemos.
Saibamos, quase
Maliciosos,
Sentir-nos ir.

Não vale a pena
Fazer um gesto.
Não se resiste
Ao deus atroz
Que os próprios filhos
Devora sempre.

Colhamos flores.
Molhemos leves
As nossas mãos
Nos rios calmos,
Para aprendermos
Calma também.

Girassóis sempre
Fitando o sol,
Da vida iremos
Tranquilos, tendo
Nem o remorso
De ter vivido.


RICARDO REIS
Pessoa, Fernando. Obra poética. Rio de Janeiro: Aguilar, 1999.

(1) plácidas - calmas
(2) incautos - desprevenidos
(3) conforme calha - conforme seja

TEXTO IV

Lembra-te de que tempo é dinheiro. Aquele que pode ganhar dez xelins* por dia com seu trabalho e vai passear, ou fica vadiando metade do dia, embora não despenda mais do que seis pence durante seu divertimento ou vadiação, não deve computar apenas essa despesa; gastou, na realidade, ou melhor, jogou fora, cinco xelins a mais.
(...)
Aquele que perde cinco xelins, não perde somente esta soma, mas todo o proveito que, investindo-a, dela poderia ser tirado, e que durante o tempo em que um jovem se torna velho, integraria uma considerável soma de dinheiro.
BENJAMIN FRANKLIN

(*) xelim − unidade de moeda equivalente a 12 pence

WEBER, Max. Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1985.

TEXTO V

Dizemos, com frequência, que fomos atropelados pelos acontecimentos − mas quais acontecimentos têm poder de atropelar o sujeito? Aqueles em direção aos quais ele se precipita,
com medo de ser deixado para trás. Deixamo-nos atropelar, em nossa sociedade competitiva, porque medimos o valor do tempo pelo dinheiro que ele pode nos render. Nesse ponto remeto o leitor, mais uma vez, à palavra exata do professor Antonio Candido: “O capitalismo é o senhor do tempo. Mas tempo não é dinheiro. Isso é uma brutalidade. O tempo é o tecido de nossas vidas”. A velocidade normal da vida contemporânea não nos permite parar para ver o que atropelamos; torna as coisas passageiras, irrelevantes, supérfluas.

MARIA RITA KEHL
<mariaritakehl.psc.br>

Os textos IV e V apresentam posições opostas sobre a relação com o tempo: para o primeiro, tempo é dinheiro, porque deve ser empregado em produzir riqueza; para o segundo, tempo não pode ser resumido ao dinheiro, porque isso é uma brutalidade.
Com base na leitura de todos os textos e de suas elaborações pessoais sobre o tema, escolha uma das duas posições e a defenda, redigindo um texto argumentativo em prosa.  


Resposta:

Além dos textos que antecipam os enunciados da prova, mais dois serviriam de base de apoio para interpretação do tema; o de Benjamin Franklin que consagrou a expressão “tempo é dinheiro” e o de Maria Rita Kehl que endossa a opinião de Antônio Cândido, que critica essa postura agressiva como típica de um sistema que vê o aumento de capital como um fim em si mesmo e subverte o verdadeiro sentido da vida, transformando o que é essencial em algo passageiro e descartável. Assim, a tese deveria assumir a defesa de uma das duas posições: considerar o tempo como mercadoria que visa à prosperidade e aumento de patrimônio pessoal ou como investimento para construção do que considera essencial à sua própria vida, como fruição do lazer ou ampliação do saber. Enquanto que a primeira posição está vinculada ao espírito do capitalismo moderno, em que cada minuto parado acarreta prejuízos que são calculados quantitativamente, a segunda prioriza a qualidade de vida relativamente ao mundo que nos rodeia de forma consciente, mas prazerosa. Os argumentos devem ser consistentes com a tese apresentada e a conclusão, sucinta e coerente.  




TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES:
PRIMEIRO ATO

Amelinha - (Virando-se para a mãe) 6Edmundo está inocente. Sem culpa.
Valdelice - (Fazendo-a calar) Não repita 30essa asneira. (Pausa) 13Temos de pressioná-lo, minha filha. 14Você não tem idade para perceber a ruindade dos homens. Você foi 12se-du-zi-da.
Amelinha - (Sentando-se) 3Seduzida?! Mas eu sei que não é verdade!
Valdelice - A história tem de ser diferente... Trate de se convencer 31disso.
            [...]
Amelinha - 9Não me sinto bem em dizer o que não fiz...
Agente - Aprenda 21a primeira lição: 2às vezes a verdade não é a que se conhece, mas a outra... (Pausa) É ir por mim. (Notando o laço de fita da moça) Pra que este laço?
Amelinha - Foi ideia da mamãe.
Valdelice - Não a quero desgraciosa diante da autoridade.
Agente - (Compenetrado) Nada de 1lacinho de fita! Você não é anjo de procissão. (Tom) Quem perde a honra não se interessa por enfeite. (Ríspido) 15Tire-o.
Amelinha - (Indecisa) 10Mas eu... eu...
Agente - (Arrebata-lhe o laço) Bobagem! (Pausa). 22Retire também 35o ruge, o batom... 28Tenho de prepará-la para impressionar o delegado, o juiz, todo mundo. Do contrário, ninguém defenderá você. (Tom) Assanhe os cabelos.

SEGUNDO ATO

Benedito - 29(À Amelinha, que continua assustada, mas impressionada com a situação que vive). Então, você acabou sendo enganada? (Ela aquiesce) 11Levou-a no caminhão da entrega sistemática, não foi? (Ela confirma) Vá ver que era um caminhão Ford. (Ao Permanente) Ford! A influência nefasta do capitalismo internacional! (Pausa) E os botijões? Balançavam? Sacudiam? (Pausa) Estavam cheios... ou vazios?
Amelinha - (Num sopro) Vazios...
Benedito - (Eufórico) Vazio! (Pausa, em explosão) Vibravam, não? (Dramatizando) Imagino como não eram ruidosos! (T) Tática de cinema americano, "noir", de péssima qualidade. (Pausa) E o carro? Corria veloz? E você, gritava?
Amelinha - (Voz débil, a confirmar) Gritava.
            [...]
Benedito - (A Amelinha) Então estavam vazios os botijões (Ela concorda) Vazios... E o carro corria, em disparada, não? (Ela aquiesce) E fazia aquele ruído...
Amelinha - (Que vai aderindo, qual participasse de um jogo...) 4Um ruído terrível...
Benedito - Ah, eu imagino! (T.) 26E o seu desespero? Hem, moça?
Amelinha - Ah, como eu sofri dentro do caminhão...
Valdelice - (Surpresa, à filha) Você nunca me falou antes em caminhão. Que carro é esse?
Amelinha - (Indiferente) O caminhão, mãe... Caminhão Ford.
            [...]
Benedito - 25E depois? Hem? Depois?
Amelinha - (Enlevada, mais fantasiosa) Ele me apertava em seus braços fortes, sem mais querer me soltar. (Tom) Meu Deus, era bom, mas eu sofria. (Pausa) Eu me sentia tonta, desfalecida, principalmente pelo som infernal dos botijões... E por cima de tudo, eu tinha medo de morrer.
Benedito - (Animando-a) Mais, mais, vai para a primeira página.
Amelinha - Paramos num lugar distante, como se diz mesmo? ... ermo... (Pausa) Onde era? Onde? Ainda hoje me pergunto, sem resposta... (Pausa. T.) Nem sei direito. 23Mas sei que havia uma árvore muito frondosa, e tinha um rio largo, perto... e... acho que havia também uma cabana. Um velho pescador estava sentado, longe, longe, numa pedra...
Valdelice - 17Minha filha, você está descrevendo o calendário da sala de jantar!
            [...]
Benedito - E depois, e depois?
Amelinha - 7Ele começou a puxar o zíper do meu vestido.
Valdelice - 18Mas você não tem vestido de zíper!!!
Benedito - Vá contando, me agrada! É matéria de primeira página.
Amelinha - 8Por fim, rasgou minha combinação de "nylon".
Valdelice - "Nylon"?! Você nunca usou 32isso!
            [...]
Valdelice - (Como se tudo fosse um sonho) Agora que você está mais calma, me diga mesmo como é a história do caminhão, dos botijões vazios... Onde você conseguiu 33tudo isso?
Amelinha - E eu sei, mamãe?! 27Simpatizei com o moço, e dei de imaginar tudo. (Pausa. T) Será que o meu retrato vai sair bonito no jornal?
            [...]
Edmundo - (Principia a falar com indecisão, procurando achar as palavras) 24Amelinha, eu... queria que você compreendesse... Por favor, 16conte ao Delegado o que em verdade se passou 19entre nós dois... Sei que você é direita... (Pausa) Fale.
Amelinha - (Em tom indefinido, como se na verdade vivesse outro personagem) 5Será que você já esqueceu?
Edmundo - Esqueceu o quê? Não compreendo.
Amelinha - Oh, Edmundo... Vocês, homens, esquecem tão ligeiro!
Edmundo - 20Mas não esqueci nada! Lembro que você me chamou à sua casa. E me abraçava, me queria... E eu então não pude resistir.
            [...]
Amelinha - Oh, ao menos hoje, não seja cínico! O caminhão, os botijões vazios! Vamos, não diga que não se lembra! Você me carregou, eu não queria... Me convidou para ver os enfeites da boleia, e, de repente, acionou o motor, partiu veloz. Ah. Foi quando eu gritei, gritei: 34Não faça isso. Edmundo! Pare! Pare! E você correndo, nem me deu atenção!
Edmundo - (Ao Delegado) Isso não! Ao menos a verdade!
           
CAMPOS, Eduardo. A donzela desprezada. In:________. Três peças escolhidas. Fortaleza: Edições UFC, 2007, p.187-221.



5. (Ufc)  Dentre algumas funções, AS RETICÊNCIAS são empregadas para denotar:

( 1 ) hesitação;
( 2 ) enumeração incompleta.

Observe, nas passagens do texto transcritas a seguir, o emprego das reticências, identifique a razão pela qual foram utilizadas e, em seguida, de acordo com o código apresentado, preencha os parênteses, estabelecendo a correlação adequada entre o uso na passagem e o valor denotado.

1. (     ) "Retire também o ruge, o batom..." (ref. 22).
2. (     ) "Mas sei que havia uma árvore muito frondosa, e tinha um rio largo, perto... e... acho que havia também uma cabana" (ref. 23).
3. (     ) "Amelinha, eu... queria que você compreendesse... Por favor, conte ao Delegado o que em verdade se passou entre nós dois... Sei que você é direita... (Pausa) Fale" (ref. 24).


Resposta:

(2) - (1) - (1).



  
6. (Ufc)  Dentre algumas funções, A VÍRGULA é empregada para separar:

(1) Vocativo;
(2) Repetições;
(3) Termos coordenados;
(4) Oração adjetiva de valor explicativo;
(5) Orações coordenadas aditivas proferidas com pausa.

Observe, nas passagens do texto transcritas a seguir, o emprego das vírgulas, identifique a razão pela qual foram utilizadas e, em seguida, de acordo com o código apresentado, preencha os parênteses, estabelecendo a correlação adequada entre o uso e a regra.

1. (     ) "E depois, e depois?" (ref. 25).
2. (     ) "E o seu desespero? Hem, moça?" (ref. 26).
3. (     ) "Temos de pressioná-lo, minha filha" (ref. 13).
4. (     ) "Simpatizei com o moço, e dei de imaginar tudo" (ref. 27).
5. (     ) "Tenho de prepará-la para impressionar o delegado, o juiz, todo mundo" (ref. 28).
6. (     ) "(À Amelinha, que continua assustada, mas impressionada com a situação que vive.)" (ref. 29).


Resposta:

(2) - (1) - (1) - (5) - (3) - (4).



  
7. (Fgv)  80% dos professores são mestres e doutores - ÍNDICE SIMILAR ÀS MELHORES FACULDADES PÚBLICAS BRASILEIRAS.
            (Texto de anúncio publicitário.)

O trecho em destaque nesse texto é marcado por quebra de paralelismo entre os termos relacionados pela noção de similaridade.
a) Explique em que consiste essa quebra de paralelismo no contexto dado.
b) Reescreva o trecho, eliminando essa impropriedade.


Resposta:

a) Não há quebra de paralelismo na questão. Ocorreu omissão do termo que é o núcleo do segundo elemento da comparação - o substantivo "índice" ou o pronome "o", que o substituiria.
b) Possível resposta: "... índice similar ao das melhores faculdades públicas brasileiras".




TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
MAÍRA

            Maíra só descobriu todo o seu poder um dia quando brincava com Micura na praia. Cada um deles tinha, levantada, uma mão cheia de vaga-lumes para alumiar, mas a luzinha era muito pouca. Maíra desenhou, assim mesmo, ali na areia da praia, uma arraia com seu ferrão e tudo. Mas naquela penumbra se distraiu pisou na arraia desenhada. Foi aquela ferroada! Compreendeu, então, que podia fazer qualquer coisa:
            - Sou Maíra - lembrou - sou o arroto de Deus-Pai. Ele, ambir, agora tem nome: é Mairahú, meu pai. Meu filho será Mairaíra. - Pegou então a conversar com o irmão, Micura, sobre o que podiam fazer.
            Maíra: - O mundo de Mairahú, meu pai, é feio e triste. Não um mundo bom para a gente viver. Podemos melhorá-lo.
            Micura: - Não vá o Velho se ofender!
            Maíra: - Pode ser. É melhor não fazer nada.
            Micura: - Bobagem. Alguma coisinha podemos fazer.
            Maíra: - Vamos, então, tomar dos que têm, o que eles têm, para dar aos que não têm.
            Micura saltou alegre: - Sim, vamos, primeiro o fogo. Ando com frio e com muita vontade de comer um churrasco.
            O fogo era do Urubu-rei que mandava na aldeia grande das gentes urubus. Eles só comiam corós de carniça tostados no borralho. Não precisavam tanto do fogo. Usavam mais era luz para ver bem a carniça e o calor para esquentar o corpo nu quando se desvestiam das penas para brincar de gente.
            O jeito que os gêmeos encontraram para roubar o fogo foi matar um veado grande, muito grande, deixá-lo apodrecer para criar bastante bicho-coró e, então, mandar levar uma moqueca de corós para o Urubu-rei e convidá-lo para vir à comilança. Assim fizeram. Maíra desenhou um cervo enorme, soprou para que vivesse e o matou ali mesmo. Quando estava bem podre e bichado, mandaram o passarinho que fala mais línguas, um papagaio, maracanã, atrás do Urubu-rei. Eles ficaram escondidos debaixo da carniça para agarrar o reizão bicéfalo quando ele pousasse. Assim fizeram. Quando o Urubu-rei estava bem preso, Maíra gritou:
            - Calma, meu rei. Não tenha medo. Só quero o fogo pro meu povinho. Todos andam com frio. Só comem o cru.
            Mas se armou a maior das confusões porque o Urubu-rei começou a responder com as duas cabeças, falando ao mesmo tempo, cada qual dizendo uma coisa. Maíra não entendia nada. Aí uma cabeça do Urubu-rei virou-se para a outra e as duas caíram numa discussão cerrada. O tempo ia passando sem que Maíra soubesse o que fazer. Afinal, teve a ideia de mandar Micura agarrar o rei-falador. Levantou, então, suas duas mãos e fez de cada uma delas uma cabeça de urubu com bico e tudo e passou, assim, a conversar duro com as duas cabeças do reizão. Só deste modo conseguiu que ele mandasse trazer o fogo, mas o rei ainda quis enganar Maíra entregando fogos que queimavam pouco e não davam luz. Felizmente ali estava Micura experimentando tudo. Provava um e dizia:
            - Não, este não serve não; não é o fogo que precisamos. Não, este também não é o fogo que precisamos. Não, este também não é o fogo de verdade. - Afinal, conseguiram o fogo verdadeiro e fizeram o trato.
            Maíra: - Vocês urubus vão comer carniça com fartura; o chefão de duas cabeças vai ficar com uma só, para não enganar mais ninguém, mas nesta vai usar esse diadema vermelho e branco que eu lhe dou agora.
            Urubu-rei: - Fiquem com o fogo vocês, mairuns. Mas façam muita carniça pra nós.
(Darcy Ribeiro. Maíra.)

PROMETEU ACORRENTADO
Ésquilo

(A cena é o pico duma montanha deserta. Chegam Poder e Vigor, que trazem preso Prometeu; segue-os, coxeando, Hefesto, carregando correntes, cravos e malho.)
            PODER. Eis-nos chegados a um solo longínquo da terra, caminho da Cítia, deserto ínvio. Hefesto, é mister te desincumbas das ordens enviadas por teu pai, acorrentando este celerado, com liames inquebráveis de cadeias de aço, aos rochedos de escarpas abruptas. Ele roubou uma flor que era tua, o brilho do fogo, vital em todas as artes, e deu-a de presente aos mortais; é preciso que pague aos deuses a pena desse crime, para aprender a acatar o poder real de Zeus e renunciar o mau vezo de querer bem à Humanidade.
            HEFESTO. Poder e Vigor, a incumbência de Zeus para vós está terminada; nada mais vos embarga. Eu, porém, não me animo a agrilhoar à força um deus meu parente a um píncaro aberto às intempéries. Todavia, é imperioso criar essa coragem; é grave negligenciar as ordens de meu pai. (...)
            PODER. Basta! Para que te atardares em lástimas perdidas? Por que não abominas o deus mais odioso aos deuses, que entregou aos mortais um privilégio teu?
            HEFESTO. O parentesco e a amizade são forças formidáveis.
            PODER. Concordo, mas como se podem transgredir as ordens de teu pai? Isso não te infunde medo?
            HEFESTO. Tu és sempre cruel e audacioso.
            PODER. Lamentos não curam os teus males; não te canses à toa em lástimas ineficazes.
            HEFESTO. Oh! que ofício detestável!
(...)
            HEFESTO. Podemos ir. Seus membros já estão amarrados.
            PODER. (a Prometeu) Abusa, agora! Furta aos deuses seus privilégios para entregá-los aos seres efêmeros! Que alívio te podem dar deste suplício os mortais? Errados andaram os deuses em te chamarem Prometeu; tu mesmo precisas de alguém que te prometa um meio de safar-te destes hábeis liames!
(Retiram-se Poder, Vigor e Hefesto.)
            PROMETEU. Éter divino! Ventos de asas ligeiras! Fontes dos rios! Riso imensurável das vagas marinhas! Terra, mãe universal! Globo do sol, que tudo vês! Eu vos invoco. Vede o que eu, um deus, sofro da parte dos deuses! Contemplai quão ignominiosamente estracinhado hei de sofrer pelas miríades de anos do tempo em fora! Tal é a prisão aviltante criada para mim pelo novo capitão dos bem-aventurados! Ai! Ai! Lamento os sofrimentos atuais e os vindouros, a conjeturar quando deverá despontar enfim o termo deste suplício. Mas que digo? Tenho presciência exata de todo o porvir e nenhum sofrimento imprevisto me acontecerá. Cumpre-me suportar com a maior resignação os decretos dos fados, sabendo inelutável a força do Destino. Contudo, não posso calar nem deixar de calar minha desdita. Por ter feito uma dádiva aos mortais, estou jungido a esta fatalidade, pobre de mim! Sou quem roubou, caçada no oco duma cana, a fonte do fogo, que se revelou para a Humanidade mestra de todas as artes e tesouro inestimável. Esse o pecado que resgato pregado nestas cadeias ao relento.
(Teatro Grego. Seleção, introdução, notas e tradução direta do grego por Jaime Bruna. São Paulo: Cultrix, 1964.)



8. (Unesp)  Muitos verbos, como é o caso de "renunciar", apresentam mais de uma regência, por vezes sem alteração relevante de significado, de modo que a realização da regência em cada frase se torna dependente da escolha estilístico-expressiva do escritor. Com base nesse fato,
a) considerando que na frase "e renunciar o mau vezo de querer bem à Humanidade" o verbo "renunciar" aparece como transitivo direto, escreva uma frase em que o mesmo verbo apareça como transitivo indireto e outra em que apareça como intransitivo;
b) reescreva a seguinte frase de Micura tornando o verbo "precisar" transitivo indireto: "Não, este também não é o fogo que precisamos".


Resposta:

a) Transitivo indireto: Ele renunciou aos bens que herdara.
Intransitivo: O presidente renunciou .
b) Não, este também não é o fogo de que precisamos.




TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
Partimo-nos assim do santo templo
Que nas praias do mar está assentado,
Que o nome tem da terra, para exemplo,
Donde Deus foi em carne ao mundo dado.
Certifico-te, ó Rei, que se contemplo
Como fui destas praias apartado,
Cheio dentro de dúvida e receio,
Que a penas nos meus olhos ponho o freio.
(Camões, Os Lusíadas, Canto 4º - 87.)



9. (Ufscar)  Nessa estrofe, há um verbo empregado com uma regência diferente da que se usa nos dias de hoje, no português do Brasil.
a) Identifique essa construção.
b) Redija uma frase com esse mesmo verbo, utilizando a sua regência atual.


Resposta:

a) A construção é a do verbo partir-se ("Partimo-nos..."). O emprego pronominal desse verbo é feito, no Brasil, com o sentido de "quebrar-se, dividir-se em pedaços": o jarro partiu-se. No sentido de "afastar-se, ir embora", emprega-se o verbo sem pronome.

b) Partimos assim do santo templo.




TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
IGUAL-DESIGUAL

Eu desconfiava:
todas as histórias em quadrinho são iguais.
Todos os filmes norte-americanos são iguais.
Todos os filmes de todos os países são iguais.
Todos os best-sellers são iguais.
Todos os campeonatos nacionais e internacionais de futebol são iguais.
Todos os partidos políticos
são iguais.
Todas as mulheres que andam na moda
são iguais.
Todas as experiências de sexo
são iguais.
Todos os sonetos, gazéis, virelais, sextinas e rondós são iguais
e todos, todos
os poemas em verso livre são enfadonhamente iguais.

Todas as guerras do mundo são iguais.
Todas as fomes são iguais.
Todos os amores, iguais iguais iguais
Iguais todos os rompimentos.
A morte é igualíssima.
Todas as criações da natureza são iguais.
Todas as ações, cruéis, piedosas ou indiferentes, são iguais.
Contudo, o homem não é igual a nenhum outro homem, bicho ou coisa.

Ninguém é igual a ninguém.
Todo ser humano é um estranho ímpar.
ANDRADE, Carlos Drummond de. A paixão medida. In: Nova reunião: 19 livros de poesia. RJ: José Olympio, 1985. Vol. 2. p. 537.

- best-sellers - os livros mais vendidos (termo em inglês)
- sonetos, gazéis, virelais, sextinas, rondós - formas fixas de composição poética


10. (G1 - cp2)  Leia os versos a seguir, retirados do texto.

"Todas as guerras do mundo são iguais.
Todas as fomes são iguais.
Todos os amores, iguais iguais iguais."

a) No verso "Todos os amores, iguais iguais iguais", o uso da vírgula serviu para substituir um termo já utilizado anteriormente. Reescreva o verso, trocando a vírgula pela palavra substituída.
b) A repetição da palavra "iguais" em um só verso é empregada para intensificar uma ideia. Copie, da 2a estrofe, um verso em que apareça outro processo de intensificação.


Resposta:

a) Todos os amores são iguais iguais iguais.
b) "A morte é igualíssima". 

Links para questões de outras disciplinas : 

Bons estudos!

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