sábado, 4 de maio de 2013

FUVESP - linguagem - Questões discursivas com gabarito comentado





1. (Fuvest 2011)  Os ventos alísios fazem parte da circulação atmosférica global, soprando das zonas tropicais, de alta pressão, para a zona equatorial, de baixa pressão, sendo responsáveis, por exemplo, pelo transporte de umidade oceânica para o nordeste brasileiro. Esse tipo de vento aparece no poema de João Cabral de Melo Neto “A escola das facas”, publicado em 1980 no livro de mesmo nome, a seguir.

            O alísio ao chegar ao Nordeste
            baixa em coqueirais, canaviais;
            cursando as folhas laminadas,
            se afia em peixeiras, punhais.
            Por isso, sobrevoada a Mata,
            suas mãos, antes fêmeas, redondas,
            ganham a fome e o dente da faca
            com que sobrevoa outras zonas.
            O coqueiro e a cana lhe ensinam,
            sem pedra-mó, mas faca a faca
            como voar o Agreste e o Sertão:
            mão cortante e desembainhada.

a) Existe relação entre o que ocorre com o “alísio”, ao chegar ao Nordeste, e a palavra “escola”, presente no título do poema de João Cabral de Melo Neto? Explique.
b) A umidade do ar, trazida pelos ventos alísios, diminui ao entrar no continente. Descreva e explique duas adaptações evolutivas, relacionadas a esse fato, que diferenciam a vegetação da Zona da Mata da vegetação do Sertão.


Resposta:

Questão interdisciplinar.

a) Comentário de Língua Portuguesa. De acordo com o enunciado, o alísio sopra das zonas tropicais, de alta pressão, para a zona equatorial, de baixa pressão, e transporta a umidade oceânica para o nordeste. Ou seja, a baixa pressão atrai a umidade. Do mesmo modo, a baixa quantidade de mão de obra dessa região atrai o trabalhador do Agreste e do Sertão. Assim como o alísio transita pela região levando a umidade, os trabalhadores espalham-se pela região cortando a cana e colhendo o coco: é a “escola” das facas. O trecho que melhor explicita essa relação é: “O coqueiro e a cana lhe ensinam, / sem pedra-mó, mas faca a faca / como voar o Agreste e o Sertão: / mão cortante e desembainhada”.

b) Comentário de Geografia. Ao entrar pelo interior do território, os ventos alísios perdem umidade no contato com as unidades de relevo como a Chapada da Borborema. Nas áreas onde ocorre este contato formam-se chuvas orográficas que permitem a existência da Zona da Mata, recoberta por floresta tropical. O ar atravessa o relevo e chega ao Sertão com baixa umidade, ajudando na formação de espécies vegetais xerófitas, cactáceas, muito adaptadas à falta ou pouca água.   



  
2. (Fuvest 2013)  Leia o texto.

Na mídia em geral, nos discursos, em mensagens publicitárias, na fala de diferentes atores sociais, enfim, nos diversos contextos em que a comunicação se faz presente, deparamo-nos repetidas vezes com a palavra cidadania. Esse largo uso, porém, não torna seu significado evidente. Ao contrário, o fato de admitir vários empregos deprecia seu valor conceitual, isto é, sua capacidade de nos fazer compreender certa ordem de eventos. Assim, pode-se dizer que, contemporaneamente, a palavra cidadania atende bastante bem a um dos usos possíveis da linguagem, a comunicação, mas caminha em sentido inverso quando se trata da cognição, do uso cognitivo da linguagem. Por que, então, a palavra cidadania é constantemente evocada, se o seu significado é tão pouco esclarecido?

Maria Alice Rezende de Carvalho, Cidadania e direitos.

a) Segundo o texto, em que consistem o uso comunicativo e o “uso cognitivo” da linguagem? Explique resumidamente.
b) Responda sucintamente a pergunta que encerra o texto: “Por que, então, a palavra cidadania é constantemente evocada, se o seu significado é tão pouco esclarecido?”  


Resposta:

a) Na mídia em geral, a linguagem é vazia de sentido por repetição excessiva ou inadequação ao contexto fatual, enquanto que o uso cognitivo da linguagem diz respeito ao perfeito entendimento do termo, ou seja, ao processo mental da informação.
b) A palavra cidadania é constantemente evocada por se tratar de assunto amplamente discutido, mas, muitas vezes, de forma banal, sem a preocupação com o seu verdadeiro significado: exercício consciente das ações do indivíduo na sociedade. 



  
3. (Fuvest 2012)  Leia com atenção o seguinte texto:

A onipresença do olho mágico da televisão no centro da vida doméstica dos brasileiros, com o 1poder (imaginário) de tudo mostrar e tudo ver que os espectadores lhe atribuem, vem provocando curiosas alterações nas relações entre o público e o privado. Durante pelo menos dois séculos, o bom gosto burguês nos ensinou que algumas coisas não se dizem, não se mostram e não se fazem em público. Essas mesmas coisas, até então reservadas ao espaço da privacidade, hoje ocupam o centro da cena televisiva. Não que o bom gosto burguês deva ser tomado como referência indiscutível da 2ética que regula a vida em qualquer sociedade. Mas a inversão de padrões que pareciam tão convenientemente estabelecidos nos países do Ocidente dá o que pensar. No mínimo, podemos concluir que a burguesia do terceiro milênio já não é a mesma que ditou o bom comportamento dos dois séculos passados. No máximo, supõe-se que os fundamentos do contrato que ordenava a vida social entre os séculos XIX e XX estão profundamente abalados, e já vivemos, sem nos dar conta, em uma sociedade pós-burguesa, num sentido semelhante ao do que chamamos uma sociedade pós-moderna.

Maria R. Kehl, in Bucci e Kehl, Videologias: ensaios sobre televisão.

a) O que a autora do texto quer dizer, quando se refere ao “poder de tudo mostrar e tudo ver” (ref.1), atribuído à televisão, como “imaginário”?
b) Indique a palavra do primeiro período que tem o mesmo significado do prefixo que entra na formação da palavra “onipresença”.
c) Indique uma palavra ou expressão do texto que corresponda ao sentido da palavra “ética” (ref.2).


Resposta:

a) O uso dos parênteses destaca o termo “imaginário” no contexto da frase, para enfatizar que a televisão produz o efeito ilusório de que as imagens transmitidas ao espectador passivo representam a realidade.

b) O prefixo “oni” significa “tudo”, termo que é repetido na frase “tudo mostrar e tudo ver”.

c) Define-se ética como o conjunto de princípios, normas e regras que visem a um comportamento moral exemplar, o que é sugerido na expressão “bom comportamento”.



  
4. (Fuvest 2012)  Leia o excerto de Memórias de um sargento de milícias, de Manuel Antônio de Almeida, para responder ao que se pede.

Caldo Entornado

A comadre, tendo deixado o major entregue à sua vergonha, dirigira-se imediatamente para a casa onde se achava Leonardo para felicitá-lo e contar-lhe o desespero em que a sua fuga tinha posto o Vidigal. (...) A comadre, segundo seu costume, aproveitou o ensejo, e depois que se aborreceu de falar no major desenrolou um sermão ao Leonardo, (...). O tema do sermão foi a necessidade de buscar o Leonardo uma ocupação, de abandonar a vida que levava, gostosa sim, porém sujeita a emergências tais como a que acabava de dar-se. A sanção de todas as leis que a pregadora impunha ao seu ouvinte eram as garras do Vidigal.

Você concorda com as afirmações que seguem? Justifique suas respostas.

a) Vê-se, no excerto, que a comadre procura incutir em Leonardo princípios morais destinados a corrigir o comportamento do afilhado.
b) No sermão que prega a Leonardo, a comadre manifesta a convicção de que o trabalho é fator decisivo na formação da personalidade de um jovem.


Resposta:

 a) Nota-se, no excerto, que a comadre não tinha atributos de personalidade adequados para fomentar em Leonardo qualidades positivas que visassem à transformação do seu caráter malandro. O fato de felicitá-lo por ter escapado de uma merecida punição e por ter exposto a figura da autoridade ao ridículo, assim como o de demonstrar prazer em falar longamente da vida alheia não constituem bons exemplos de quem quer ser conselheira de boa conduta moral e ética. Estes gestos, ao invés de contribuírem para corrigir o comportamento de Leonardo, servem de mau exemplo e incentivam a inconsequência de quem vive em função de prazeres e ao sabor da boa ou má sorte.

b) Percebe-se que a maior preocupação da comadre era livrar Leonardo das consequências negativas a que estaria sujeito, caso não arranjasse uma ocupação. Essas consequências estavam intimamente ligadas à ação de Vidigal que perseguia os desocupados e os castigava sem moderação. Assim, não era a convicção de que o trabalho era fator decisivo na formação do caráter do afilhado que movia a comadre, mas sim a necessidade de que este escapasse da punição, ainda que à custa do abandono de uma vida de prazeres.



  
5. (Fuvest 2012)  Leia o excerto de A cidade e as serras, de Eça de Queirós, e responda ao que se pede.

Na sala, a tia Vicência ainda nos esperava desconsolada, entre todas as luzes, que ardiam no silêncio e paz do serão debandado:
- Ora uma coisa assim! Nem querem ficar para tomar um copinho de geleia, um cálice de vinho do Porto!
- Esteve tudo muito desanimado, tia Vicência! - exclamei desafogando o meu tédio. - Todo esse mulherio emudeceu, os amigos com um ar desconfiado...
Jacinto protestou, muito divertido, muito sincero:
- Não! Pelo contrário. Gostei imenso. Excelente gente! E tão simples... Todas estas raparigas me pareceram ótimas. E tão frescas, tão alegres! Vou ter aqui bons amigos, quando verificarem que eu não sou miguelista.
Então contamos à tia Vicência a prodigiosa história de D. Miguel escondido em Tormes... Ela ria! Que coisas! E mau seria...
- Mas o Sr. Jacinto, não é?
- Eu, minha senhora, sou socialista...

a) Defina sucintamente o miguelismo a que se refere o texto e indique a relação que há entre essa corrente política e a história do Brasil.
b) Tendo em vista o contexto da obra, explique o que significa, para Jacinto, ser “socialista”.


Resposta:

a) No final do século XIX, estabeleceu-se na sociedade portuguesa uma visão generalizada de duas correntes políticas que se opunham: miguelismo, defensora da corrente absolutista, e liberalismo, portadora de anseios políticos renovadores. Reagindo negativamente à aclamação de D. Pedro como rei de Portugal, os adeptos de seu irmão D. Miguel, ligados às alas mais conservadoras da burguesia e à igreja católica mais retrógrada, conspiravam secretamente para derrubar os liberais, ligados ao rei. Assim, o miguelismo era considerado pela população como a facção defensora dos princípios absolutistas, símbolo de um estado retrógrado e reativo aos anseios republicanos que já se faziam sentir, o que explica a deserção de todos os convidados da tia Vicência. D. Pedro I do Brasil e IV de Portugal, depois de abdicar do trono brasileiro, parte para Portugal, derrota os miguelistas e abre espaço para o estabelecimento de governo regencial no Brasil enquanto D. Pedro II não atinge a maioridade.

b) Em “A cidade e as serras”, desenvolve-se a tese de que a prosperidade social acontece como resultado da intervenção patronal na melhoria de condições de sobrevivência dos trabalhadores, assim como a introdução da tecnologia na produção rural. Trata-se de uma visão reformista, pois não interfere na divisão da propriedade, nem altera a estratificação social do regime vigente, o que contraria a filosofia socialista clássica. Jacinto declara-se “socialista” por ter amenizado as duras condições de vida dos seus empregados, à luz de uma ação assistencial e paternalista.



  
6. (Fuvest 2012)  Leia o seguinte excerto de Capitães da areia, de Jorge Amado, e responda ao que se pede.

O sertão comove os olhos de Volta Seca. O trem não corre, este vai devagar, cortando as terras do sertão. Aqui tudo é lírico, pobre e belo. Só a miséria dos homens é terrível. Mas estes homens são tão fortes que conseguem criar beleza dentro desta miséria. Que não farão quando Lampião libertar toda a caatinga, implantar a justiça e a liberdade?

Compare a visão do sertão que aparece no excerto de Capitães da areia com a que está presente no livro Vidas secas, de Graciliano Ramos, considerando os seguintes aspectos:

a) a terra (o meio físico);
b) o homem (o sertanejo).

Responda, conforme solicitado, considerando cada um desses aspectos nas duas obras citadas.


Resposta:

a) Em ambas as obras, o cenário é de desolação, inóspito e incitador à violência, pois o trabalho nas terras calcinadas pelo calor desumaniza as pessoas que ali têm de lutar pela sua sobrevivência, igualando-as aos animais. No entanto, não se percebe nas descrições de “Vidas secas” instantes de encantamento e beleza que o personagem Volta Seca exprime em “Capitães da areia” ao declarar que ali “tudo é lírico, pobre e belo”, nem do devaneio de que a ação do homem poderia “criar beleza” naquela miséria.

b) Em “Capitães de areia”, as crianças abandonadas na orla da praia lutam pela sobrevivência em ambiente urbano, sujeitas à crueldade de um sistema opressor que as marginaliza e impele ao banditismo. Volta Seca remete às suas origens de cangaço e sonha com o retorno a uma ação de luta por justiça e liberdade. Em “Vidas secas”, o sertanejo tem a sua consciência de embotada pela sede, não só de água, mas também de conhecimento e de justiça, numa visão de mundo fragmentada que o obriga a uma constante capitulação perante o poder constituído, incapaz de uma ação violenta.



  
7. (Fuvest 2012)  Leia o trecho de Dom Casmurro, de Machado de Assis, para responder ao que se pede.

Um dia [Ezequiel] amanheceu tocando corneta com a mão; dei-lhe uma cornetinha de metal.
Comprei-lhe soldadinhos de chumbo, gravuras de batalhas que ele mirava por muito tempo, querendo que lhe explicasse uma peça de artilharia, um soldado caído, outro de espada alçada, e todos os seus amores iam para o de espada alçada. Um dia (ingênua idade!) perguntou-me impaciente:
- Mas, papai, por que é que ele não deixa cair a espada de uma vez?
- Meu filho, é porque é pintado.
- Mas então por que é que ele se pintou?
Ri-me do engano e expliquei-lhe que não era o soldado que se tinha pintado no papel, mas o gravador, e tive de explicar também o que era gravador e o que era gravura: as curiosidades de Capitu, em suma.

a) Se estabelecermos uma analogia ou um paralelo entre a gravura, de que se fala no excerto, e o romance Dom Casmurro, os termos “gravador” e “gravura” corresponderão a que elementos internos do romance?
b) Continuando no mesmo paralelo entre “gravura” e Dom Casmurro, pode-se considerar que a lição dada pelo pai ao filho, a respeito da gravura, serve de advertência também para o leitor do romance? Justifique sua resposta.


Resposta:

a) Em “Dom Casmurro”, é o narrador em 1ª pessoa, representado na figura de Bento Santiago, que constrói a narrativa dos fatos marcantes da sua vida a partir da própria interpretação da realidade. Assim, é a memória que ajuda a construir a narrativa no presente sobre uma suposta verdade de fatos já muito distanciada no tempo e filtrada pela subjetividade de quem a escreve. Da mesma forma que o gravador cria o desenho do soldado, o autor fictício Bento cria o seu próprio romance.

b) Bento explica ao filho que a obra não expressa a verdadeira realidade, pois está subordinada ao ato da criação artística do autor. Esta explicação lembra ao leitor que toda a narrativa parte de uma base ficcional e, por isso, não deve ser entendida como representação fiel dos fatos ocorridos.



  
8. (Fuvest 2012)  Leia este texto:

A correção da língua é um artificialismo, continuei episcopalmente. O natural é a incorreção.
Note que a gramática só se atreve a meter o bico quando escrevemos. Quando falamos, afasta-se para longe, de orelhas murchas.

Monteiro Lobato, Prefácios e entrevistas.

a) Tendo em vista a opinião do autor do texto, pode-se concluir corretamente que a língua falada é desprovida de regras? Explique sucintamente.
b) Entre a palavra “episcopalmente” e as expressões “meter o bico” e “de orelhas murchas”, dá-se um contraste de variedades linguísticas. Substitua as expressões coloquiais, que aí aparecem, por outras equivalentes, que pertençam à variedade padrão.


Resposta:

 a) Usando a ironia, Monteiro Lobato parte da hipótese que, se a linguagem coloquial é desprovida de regras e a linguagem escrita é subordinada às regras da gramática normativa, então conclui que “a correção da língua é um artificialismo”. Este raciocínio é falacioso, pois tanto a linguagem coloquial como a escrita mantêm vínculos com a gramática, embora sob aspectos diferentes: a primeira com a gramática discursiva, a segunda, com a gramática normativa.

b) Apenas as expressões “Meter o bico” e “orelhas murchas” pertencem ao universo da linguagem coloquial e poderiam ser substituídas, segundo a variedade padrão, por “intrometer-se” e “humilhada”, respectivamente.



  
9. (Fuvest 2011)  Leia os seguintes versos de “Alegria, Alegria”, de Caetano Veloso, e, em seguida, os dois comentários em que os autores explicam por que essa canção é uma de suas prediletas.

            Caminhando contra o vento
            Sem lenço e sem documento
            No sol de quase dezembro
            Eu vou

            O sol se reparte em crimes
            Espaçonaves, guerrilhas
            Em cardinales bonitas
            Eu vou

            Em caras de presidentes
            Em grandes beijos de amor
            Em dentes, pernas, bandeiras
            Bomba e Brigitte Bardot
            (...)

            Ela pensa em casamento
            E eu nunca mais fui à escola
            Sem lenço e sem documento
            Eu vou

            Eu tomo uma coca-cola
            Ela pensa em casamento
            E uma canção me consola
            Eu vou

            Por entre fotos e nomes
            Sem livros e sem fuzil
            Sem fome, sem telefone
            No coração do Brasil
            (...)

                                   http://www.caetanoveloso.com.br

I. “A linguagem era nova, cheia de referências visuais, e tudo estava ali, combinando temas que nem sempre pareciam combinar: despreocupação, engajamento político, tecnologia, lirismo... .”
                                                                                  Laura de Mello e Souza. Adaptado.

a) Transcreva um verso* que ilustre, de modo mais expressivo, o que está sublinhado nesse comentário. Justifique sua escolha.
    *(verso = uma linha.)

II. “A canção era importante pela força mágica de afirmar a potência criativa da vida em meio à fragmentação do mundo.”
Jurandir Freire Costa. Adaptado.

b) Transcreva um verso que exemplifique, de modo mais evidente, o que está sublinhado nesse comentário. Justifique sua escolha.


Resposta:

a) Muitos versos poderiam exemplificar o fato de a linguagem ser nova e cheia de referências visuais. No entanto, o único que combina engajamento político e tecnologia é "Espaçonave, guerrilhas", pois remete ao momento histórico que se vivia na época, com o deslumbramento diante das conquistas espaciais (espaçonaves) e, ao mesmo tempo, ao contexto político da ditadura militar, em que se observavam movimentos de luta armada (guerrilhas).

b) A própria linguagem do compositor aponta, à maneira cubista (justapondo-se diversas imagens), a fragmentação do mundo. Isso pode ser visto, principalmente, nas estrofes:

    O sol se reparte em crimes
    Espaçonaves, guerrilhas
    Em cardinales bonitas
    Eu vou
   
    Em caras de presidentes
    Em grandes beijos de amor
    Em dentes, pernas, bandeiras
    Bomba e Brigitte Bardot

    Por entre fotos e nomes
    Sem livros e sem fuzil
    Sem fome, sem telefone
    No coração do Brasil


    No entanto, o enunciado pede um verso que exemplifique essa fragmentação de modo mais evidente. Assim, o verso em que se justapõem mais imagens (três), tornando a fragmentação mais patente é: “Em dentes, pernas, bandeiras”.  



  
10. (Fuvest 2011)  Leia o texto a seguir e responda ao que se pede.

            Tem-se discutido muito sobre as funções essenciais da linguagem humana e a hierarquia natural que há entre elas. É fácil observar, por exemplo, que é pela posse e pelo uso da linguagem, falando oralmente ao próximo ou mentalmente a nós mesmos, que conseguimos organizar o nosso pensamento e torná-lo articulado, concatenado e nítido; é assim que, nas crianças, a partir do momento em que, rigorosamente, adquirem o manejo da língua dos adultos e deixam para trás o balbucio e a expressão fragmentada e difusa, surge um novo e repentino vigor de raciocínio, que não só decorre do desenvolvimento do cérebro, mas também da circunstância de que o indivíduo dispõe agora da língua materna, a serviço de todo o seu trabalho de atividade mental. Se se inicia e desenvolve o estudo metódico dos caracteres e aplicações desse novo e preciso instrumento, vai, concomitantemente, aperfeiçoando-se a capacidade de pensar, da mesma sorte que se aperfeiçoa o operário com o domínio e o conhecimento seguro das ferramentas da sua profissão. E é este, e não outro, antes de tudo, o essencial proveito de tal ensino.

J. Mattoso Câmara Jr., Manual de expressão oral e escrita. Adaptado.

a) Transcreva o trecho em que o autor trata da relação da linguagem com o pensamento.
b) Transcreva o trecho em que o autor trata da relação da linguagem com a fisiologia.
c) Segundo o autor, qual é o “essencial proveito” do ensino da língua?


Resposta:

a) “... é pela posse e pelo uso da linguagem, falando oralmente ao próximo ou mentalmente a nós mesmos, que conseguimos organizar o nosso pensamento e torná-lo articulado, concatenado e nítido...”

b) “... é assim que, nas crianças, a partir do momento em que, rigorosamente, adquirem o manejo da língua dos adultos e deixam para trás o balbucio e a expressão fragmentada e difusa, surge um novo e repentino vigor de raciocínio, que não só decorre do desenvolvimento do cérebro, mas também da circunstância de que o indivíduo dispõe agora da língua materna, a serviço de todo o seu trabalho de atividade mental.”

c) Segundo o autor, o “essencial proveito” do ensino da língua é o aperfeiçoamento da capacidade de pensar: “é pela posse e pelo uso da linguagem (...) que conseguimos organizar o nosso pensamento e torná-lo articulado, concatenado e nítido”.  



  
11. (Fuvest 2011)  Leia o seguinte texto.

Flagrado na Ilha de Caras, Fernando Pessoa disse que está bem mais leve depois que passou a ser um só.

LISBOA – Em pronunciamento que pegou de surpresa o mercado editorial, o poeta e investidor Fernando Pessoa anunciou ontem a fusão dos seus heterônimos. Com o enxugamento, as marcas Álvaro de Campos, Ricardo Reis e Alberto Caeiro passam a fazer parte da holding* Fernando Pessoa S.A. “É uma reengenharia”, explicou o assessor e empresário Mário Sá Carneiro. Pessoa confessou que a decisão foi tomada “de coração pesado”: “Drummond sempre foi um só. A operação dele é enxutinha. Como competir?”, indagou. O poeta chegou a pensar em terceirizar os heterônimos através de um call-center** em Goa, mas questões de gramática e semântica acabaram inviabilizando as negociações. “Eles não usam mesóclise”, explicou Pessoa.

http://www.revistapiaui.com.br. Adaptado.

*Holding [holding company]: empresa criada para controlar outras empresas.
**Call-center: central de atendimento telefônico.

a) Esse texto tem apenas finalidade humorística ou comporta também finalidade crítica? Justifique sua resposta.
b) Por que o “call-center” mencionado no texto seria localizado especificamente em Goa?


Resposta:

a) Podemos dizer que o texto faz uso do humor para criticar. Satiricamente, ataca-se o caráter mercadológico que a literatura apresenta atualmente, levando à sua banalização.

b) Goa faz parte da Índia, considerada a capital mundial da terceirização. O país possui numerosas centrais de atendimento telefônico em virtude do uso da mão de obra barata. Assim, compreende-se a ironia: Goa foi colônia de Portugal – de modo que apresenta ainda hoje vestígios da língua portuguesa – e, de acordo com o texto, representa a lógica mercadológica.



  
12. (Fuvest 2011)  Leia o seguinte texto e responda ao que se pede.

Em boca fechada bem-te-vi não faz ninho

            Campos de Melo passou todos os anos de sua vereança sem dar uma palavra. Era o boca de siri da câmara municipal de Cuité. Até que, uma tarde, ergueu o busto, como quem ia falar. O presidente da Mesa, mais do que depressa, disse:
            - Tem a palavra o nobre vereador.
            Então, em meio do grande silêncio, o grande mudo falou.
            - Peço licença para fechar a janela, pois estou constipado.

José Cândido de Carvalho, Se eu morrer, telefone para o céu.

a) Tendo em vista o contexto, é correto afirmar que, tanto do ponto de vista da estrutura quanto da mensagem, o título do texto constitui um provérbio?
b) Que frase do texto contribui de maneira mais decisiva para dar um caráter anedótico a essa breve narrativa? Justifique sua escolha.


Resposta:

a) Sim, pois, provérbio é uma frase curta e popular, com uma mensagem metafórica, que geralmente apresenta uma regra social ou moral. Segundo a definição do dicionário Aurélio: “1. Máxima ou sentença de caráter prático e popular, comum a todo um grupo social, expressa em forma sucinta e geralmente rica em imagens; adágio, ditado, anexim, exemplo, refrão, refrém, rifão. Ex.: ‘Casa de ferreiro, espeto de pau’; ‘Quanto maior a nau, maior a tormenta’”.

b) A frase do texto que contribui de maneira mais decisiva para dar um caráter anedótico à breve narrativa é "Peço licença para fechar a janela, pois estou constipado", pois representa o desfecho para a expectativa gerada desde o início do texto.



  
13. (Fuvest 2011)  É correto afirmar que os textos “a” e “b”, a seguir, podem ser entendidos de maneira diferente da que pretendiam seus redatores? Justifique sua resposta separadamente para cada um dos textos.

Texto a: Alguns sonhos não mudam. Quer dizer, só de tamanho. (Propaganda de uma instituição bancária)

Texto b: A chuva tirou tudo o que eles tinham. Agora vamos dar o mínimo que eles precisam. (Campanha feita por estabelecimentos comerciais em prol de vítimas de enchente)


Resposta:

Sim. No texto a, a propaganda, provavelmente, pretende sugerir que os sonhos, com o decorrer do tempo, mudam apenas de tamanho, ou seja, de menores para maiores. No entanto, a frase, como está redigida, apresenta ambiguidade, pois, de acordo com ela, os sonhos também podem mudar de maiores para menores, configurando, do mesmo modo, alteração de tamanho.

No texto b, a intenção, possivelmente, da campanha em prol de vítimas de enchente é que, já que essas pessoas perderam tudo, ajudar com pelo menos o básico de que necessitam. Porém, existe uma ambiguidade, principalmente com o uso de “mínimo”, que pode levar a entender que se fará por essas pessoas o mínimo possível, ou seja, que os idealizadores da campanha buscarão fazer o menos que puderem.  



  
14. (Fuvest 2011)  Leia o excerto de A cidade e as serras, de Eça de Queirós, e responda ao que se pede.

            Era um domingo silencioso, enevoado e macio, convidando às voluptuosidades da melancolia. E eu (no interesse da minha alma) sugeri a Jacinto que subíssemos à basílica do Sacré-Coeur, em construção nos altos de Montmartre. (...)
            Mas a basílica em cima não nos interessou, abafada em tapumes e andaimes, toda branca e seca, de pedra muito nova, ainda sem alma. E Jacinto, por um impulso bem jacíntico, caminhou gulosamente para a borda do terraço, a contemplar Paris. Sob o céu cinzento, na planície cinzenta, a cidade jazia, toda cinzenta, como uma vasta e grossa camada de caliça* e telha. E, na sua imobilidade e na sua mudez, algum rolo de fumo**, mais tênue e ralo que o fumear de um escombro mal apagado, era todo o vestígio visível de sua vida magnífica.

*Caliça: pó ou fragmentos de argamassa ressequida, que sobram de uma construção ou resultam da demolição de uma obra de alvenaria.
**Fumo: fumaça.

a) Em muitas narrativas, lugares elevados tornam-se locais em que se dão percepções extraordinárias ou revelações. No contexto da obra, é isso que irá acontecer nos “altos de Montmartre”, referidos no trecho? Justifique sua resposta.
b) Tendo em vista o contexto histórico da obra, por que é Paris a cidade escolhida para representar a vida urbana? Explique sucintamente.
c) Sintetizando-se os termos com que, no excerto, Paris é descrita, que imagem da cidade finalmente se obtém? Explique sucintamente.


Resposta:

a) Sim, pois Jacinto, que no início da obra era deslumbrado com a Cidade, defendendo a vida urbana como superior, agora, nos “altos de Montmartre”, em um momento de intenso pessimismo, reconhece que tudo o que havia valorizado outrora poderia ser ilusão.

b) Paris, no final do século XIX, era a “cidade-luz”, símbolo do mundo moderno, auge da ciência e da cultura.

c) No texto, Paris não é mais descrita como a cidade “luminosa” do início do livro, mas como cinzenta e sem vida, “jazia”. 


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Bons estudos!

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