1.
(Fuvest) Leia este texto:
Entre 1808, com a abertura
dos portos, e 1850, no auge da centralização imperial, modificara-se a pacata,
fechada e obsoleta sociedade. O país europeizava-se, para escândalo de muitos,
iniciando um período de progresso rápido, progresso conscientemente provocado,
sob moldes ingleses. O vestuário, a alimentação, a mobília mostram, no ingênuo
deslumbramento, a subversão dos hábitos lusos, vagarosamente rompidos com os
valores culturais que a presença europeia infiltrava, justamente com as
mercadorias importadas. O contato litorâneo das duas culturas, uma dominante já
no período final da segregação colonial, articula-se no ajustamento das
economias. Ao Estado, a realidade mais ativa da estrutura social, coube o papel
de intermediar o impacto estrangeiro, reduzindo-o à temperatura e à velocidade
nativas.
Raymundo Faoro,
Os donos do poder.
a) Considerado o contexto, é inteiramente
adequado o emprego, no texto, das expressões “europeizava-se” e “presença
europeia”? Explique sucintamente.
b) As palavras “litorâneo” e “temperatura”
foram usadas, ambas, no texto, em seu sentido literal? Justifique sua resposta.
Resposta:
a) As expressões “europeizava-se” e
“presença europeia” para designar a influência da cultura inglesa no cotidiano
da colônia são inadequadas, pois a sociedade brasileira já havia recebido
anteriormente a influência da cultura do colonizador português, obviamente,
também europeu.
b) As palavras “litorâneo” e “temperatura”
foram usadas em sentido figurado: a primeira refere-se às atividades comerciais
realizadas por mar entre as duas nações e a segunda à necessidade de adaptação
da cultura estrangeira à realidade local.
2.
(Pucrj) Texto 1
O Assinalado
Tu és o louco da imortal loucura,
o louco da loucura mais suprema.
A terra é sempre a tua negra algema,
prende-te nela extrema Desventura.
Mas essa mesma algema de amargura,
mas essa mesma Desventura extrema
faz que tu’alma suplicando gema
e rebente em estrelas de ternura.
Tu és o Poeta, o grande Assinalado
que povoas o mundo despovoado,
de belezas eternas, pouco a pouco.
Na Natureza prodigiosa e rica
toda a audácia dos nervos justifica
os teus espasmos imortais de louco!
BILAC, Olavo.
In: BARBOSA, Frederico (Org.). Clássicos da poesia brasileira.
Rio de Janeiro: O Globo, Klick Editora, 1997, pp.163-164.
Texto 2
Casablanca
Te acalma, minha loucura!
Veste galochas nos teus cílios tontos e
habitados!
Este som de serra de afiar as facas
não chegará nem perto do teu canteiro de
taquicardias...
Estas molas a gemer no quarto ao lado
Roberto Carlos a gemer nas curvas da Bahia
O cheiro inebriante dos cabelos na fila em
frente no cinema...
As chaminés espumam pros meus olhos
As hélices do adeus despertam pros meus
olhos
Os tamancos e os sinos me acordam depressa
na madrugada feita de binóculos de gávea
e chuveirinhos de bidê que escuto rígida nos
lençóis de pano
CESAR, Ana Cristina. A teus pés. São Paulo: Brasiliense, 1982, p.60.
a) Determine as diferenças no
emprego da linguagem e na concepção formal entre os poemas de Olavo Bilac e Ana
Cristina César.
b) Indique a figura de
linguagem presente no seguinte verso do texto 2: “Os tamancos e os sinos me
acordam depressa na madrugada feita de binóculos de gávea”.
Resposta:
a) A leitura comparativa dos
textos 1 e 2 mostra diferenças significativas entre ambos. Em termos de
utilização da linguagem e concepção formal, pode-se afirmar que o texto 1
privilegia a linguagem formal, a dicção grandiloquente e o uso de formas fixas
(o soneto), de versos metrificados (decassílabos) e de um esquema regular e
simétrico de rimas. Ana Cristina César concebe o seu poema num campo formal e
linguístico completamente diferente. Podem-se observar no texto 2 a utilização
de um vocabulário mais próximo da coloquialidade e a opção pela liberdade
formal, confirmada pelo uso dos versos livres e brancos.
b) Personificação
(prosopopeia), metáfora ou metonímia.
TEXTO PARA A
PRÓXIMA QUESTÃO:
Língua
Esta língua é como um elástico
que espicharam pelo mundo.
No início era tensa,
de tão clássica.
Com o tempo, se foi amaciando,
foi-se tornando romântica,
incorporando os termos nativos
e amolecendo nas folhas de bananeira
as expressões mais sisudas.
Um elástico que já não se pode
mais trocar, de tão usado;
nem se arrebenta mais, de tão forte.
Um elástico assim como é a vida
que nunca volta ao ponto de partida.
GILBERTO
MENDONÇA TELES
Hora aberta: poemas reunidos. Rio de Janeiro: José Olympio; Brasília: INL, 1986.
3.
(Uerj) A segunda e a terceira estrofes retratam a
língua em imagens opostas. Ao estado de rigidez se segue o de uma mudança
gradual.
Considerando a terceira estrofe, apresente o
recurso gramatical que o autor utiliza para exprimir essa gradação e o verso
que reafirma a rigidez já expressa na segunda estrofe.
Resposta:
A gradação é sugerida
através da repetição do gerúndio (“amaciando”, “tornando”, “incorporando”,
“amolecendo”) e a rigidez, no verso “as expressões mais sisudas”.
TEXTO PARA A
PRÓXIMA QUESTÃO:
As
descontroladas
As primeiras mulheres que
passaram na calçada da Rio Branco chamavam-se melindrosas. Eram um tanto
afetadas, com seu vestido de cintura baixa e longas franjas, mas a julgar por
uma caricatura célebre de J. Carlos tinham sempre uma multidão de almofadinhas
correndo atrás. O mundo, cem anos depois, mudou pouco no essencial. Diz-se
agora que o homem “corre atrás do prejuízo”. De resto, porém, a versão nacional
do assim caminha a humanidade segue o mesmo cortejo de sempre pela Rio Branco —
com o detalhe que as mulheres trocaram as franjas pelo cós baixo da calça da
Gang. E, evidentemente, não são mais chamadas de melindrosas.
Elas já atenderam por vários
nomes. Uma “uva” era aquela que, de tão suculenta e bem-feita de curvas, devia
abrir as folhas de sua parreira e deliciar os machos com a eternidade de sua
sombra. 1Há cem anos as mulheres que circulam pela Rio Branco já
foram chamadas de tudo e, diga-se a bem da verdade, algumas atenderam. Por aqui
3passou o “broto”, o “avião”, o “violão”, a “certinha”, o “pedaço”,
a “deusa”, a “boazuda”, o “pitéu”, a “gata” e tantas outras que podem não estar
mais no mapa, como as mulatas do Sargentelli, mas já estão no Houaiss
eletrônico. Houve um momento que, de tão belas, chegaram a ficar perigosas.
Chamavam-nas “pedaço de mau caminho” ou “chave de cadeia”. Algumas, de carne
tão tenra, eram “frangas”.
Havia, de um modo geral, um
louvor respeitoso na identificação de cada um desses tipos que sucederam as
melindrosas. Gosto de lembrar daquela, ali pelo início dos 60, que era um
“suco”. Talvez porque sucedesse o tipo de “uva” e fosse tão aperfeiçoada no
inevitável processo de evolução da espécie que já viesse sem casca e,
principalmente, sem os caroços. Sempre prontinhas para beber. De uns tempos
para cá, quando se pensava que na esquina surgiria um vinho de safra especial,
a coisa avinagrou. As mulheres ficam cada vez mais lindas mas os homens, na
hora de homenageá-las, inventam rótulos de carinho duvidoso. O “broto”, o
“violão” e o “pitéu” na versão arroba ponto com 2000 era a “popozuda”. Depois,
software 2001, veio a “cachorra”, a “sarada”. Pasmem: era elogio. Algumas
continuavam atendendo.
Agora está entrando em cena,
perfilada num funk do grupo As Panteras — um rótulo que, a propósito, notou a
evolução das “gatas” —, a mulher do tipo “descontrolada”. (...). Não é
exatamente o que o almofadinha lá do início diria no encaminhamento do eterno
processo sedutivo, mas, afinal, homem nenhum também carrega mais almofadas para
se sentar no bonde. Sequer bondes 2há. Já fomos “pães”. Muito doce,
não pegou. Somos todos lamentáveis “tigrões” em nossa triste sina de matar um
leão por dia.
Elas mereciam verbetes melhores,
que se lhes ajustassem perfeitos, redondos, como a tal calça da Gang. A língua
das ruas anda avacalhando com as nossas “minas”, para usar a última expressão
em que as mulheres foram saudadas com delicadeza e exatidão — dentro da mina,
afinal, 4cabe tanto a pepita de ouro como a cavidade que se enche de
pólvora para explodir e destruir tudo o que estiver em cima.
A deusa da nossa rua, que sempre
pisou os astros distraída, não passa hoje de “tchutchuca marombada” ou
“popozuda descontrolada”. É pouco para quem caminha nas pedrinhas portuguesas
como se São Pedro fosse sobre as águas bíblicas. Algumas delas, uvas do vinho
sagrado, santas apenas no aguardo da beatificação vaticana, provocando ainda
maior alvoroço, alumbramento e estupefação dos sentidos.
JOAQUIM
FERREIRA DOS SANTOS
O que as mulheres procuram na bolsa: crônicas.
Rio de Janeiro: Record, 2004.
4.
(Uerj) O cronista explica o sentido dos nomes almofadinha e mina, aplicados respectivamente ao homem e à mulher.
Resuma cada uma dessas explicações e
identifique a figura de linguagem correspondente ao uso de cada nome.
Resposta:
O termo “almofadinha”,
usado como metonímia, define o indivíduo com base em um hábito que era o de
carregar uma almofada para se sentar nos bondes. A palavra “mina” constitui uma
metáfora, associando a mulher a algo valioso e que oferece risco de confusão ou
destruição.
5.
(Fuvest) Leia atentamente este texto:
“Dos púlpitos
dessa igreja, o padre Antônio Vieira pronunciara com sua voz de fogo os sermões
mais célebres de sua carreira”, escreveu Jorge Amado, protestando [contra o projeto de
demolição da igreja da Sé]. Conta Jorge que correu na época [decênio
de 1930] a notícia de que o arcebispo
embolsou gorjeta grande para permitir que a Companhia Linha Circular de Carris
da Bahia abatesse o templo. Não há provas do suborno, é certo, mas o fato é que
o arcebispo, em documento assinado por ele mesmo, deu a sua “inteira aquiescência”
à obra destrutiva. A irritação anticlerical de Jorge Amado subiu então ao ponto
de ele fazer o elogio dos “índios patriotas” que, nos primeiros dias coloniais,
haviam realizado uma “experiência culinária” com o bispo Sardinha.
Acrescentando ainda que, naquela década de 1930, baiano já não gostava de bispo
nem como alimento.
Antonio
Risério, Uma história da cidade da Bahia. Adaptado.
a) As expressões “inteira aquiescência” e
“índios patriotas”, citadas no texto, procedem, ambas, da mesma fonte (autor
que utilizou tais expressões)? Justifique sua resposta.
b) Tendo em vista o contexto, é correto
afirmar que a expressão “experiência culinária” é usada com sentido irônico?
Resposta:
a)
As expressões “inteira aquiescência” e “índios patriotas” procedem de fontes
diferentes. A primeira está associada ao arcebispo que assinou o documento
autorizando a demolição da igreja da Sé pela Companhia Linha Circular de Carris
da Bahia; a segunda ao próprio Jorge Amado que, irritado com essa atitude,
relembrou o fato histórico do ritual antropofágico que vitimou o bispo Sardinha
pelos índios, que apelidou de “patriotas”.
b) A expressão “experiência culinária” é altamente irônica, pois
associa o ritual antropofágico, costume de caráter religioso que pretendia manifestar
respeito pela valentia do inimigo vencido e desejo de absorver assim as suas
características, ao prazer da elaboração e degustação dos alimentos.
TEXTO PARA A
PRÓXIMA QUESTÃO:
SONETO
[Moraliza o
poeta nos ocidentes do sol
a inconstância
dos bens do mundo]
Nasce
o Sol, e não dura mais que um dia,
Depois
da Luz se segue a noite escura,
Em
tristes sombras morre a formosura,
Em
contínuas tristezas a alegria.
Porém
se acaba o Sol, por que nascia?
Se
formosa a Luz é, por que não dura?
Como
a beleza assim se transfigura?
Como
o gosto da pena assim se fia?
Mas
no Sol, e na Luz, falte a firmeza,
Na
formosura não se dê constância,
E
na alegria sinta-se tristeza.
Começa
o mundo enfim pela ignorância,
E
tem qualquer dos bens por natureza
A
firmeza somente na inconstância.
(MATOS,
Gregório. Obras completas de Gregório de Matos. Salvador: Janaína, 1969,
7 volumes.)
6.
(Ufrj) De forma recorrente, o Barroco lança mão de
figuras de sintaxe como recurso expressivo.
a) Considerando o terceiro e o quarto versos
da primeira estrofe do soneto, explicite
as duas figuras de sintaxe que, nesses versos, estão relacionadas aos
termos oracionais classificados, tradicionalmente, como essenciais ou básicos.
b) Classifique, quanto à função sintática,
os constituintes do último verso da primeira estrofe.
Resposta:
a) As duas figuras de construção
sintática são as seguintes: hipérbato (inversão da ordem canônica dos termos
sintáticos “em tristes sombras” e “a formosura”, no terceiro verso, e dos
termos “em contínuas tristezas” e “a alegria”, no quarto verso); elipse/zeugma
(omissão do verbo “morre” no quarto verso).
b) O constituinte “Em
contínuas tristezas” exerce função de adjunto adverbial, e o constituinte “a
alegria”, função de sujeito.
TEXTO PARA AS
PRÓXIMAS 2 QUESTÕES:
Daí
à pedreira restavam apenas uns cinquenta passos e o chão era já todo coberto
por uma farinha de pedra moída que sujava como a cal.
Aqui,
ali, por toda a parte, encontravam-se trabalhadores, uns ao sol, outros debaixo
de pequenas barracas feitas de lona ou de folhas de palmeira. De um lado
cunhavam pedra cantando; de outro a quebravam a picareta; de outro afeiçoavam
lajedos1 a ponta de picão2; mais adiante faziam
paralelepípedos a escopro2 e macete2. E todo aquele
retintim de ferramentas, e o martelar da forja, e o coro dos que lá em cima
brocavam a rocha para lançar-lhe fogo, e a surda zoada ao longe, que vinha do
cortiço, como de uma aldeia alarmada; tudo dava a ideia de uma atividade feroz,
de uma luta de vingança e de ódio. Aqueles homens gotejantes de suor, bêbedos
de calor, desvairados de insolação, a quebrarem, a espicaçarem, a torturarem a
pedra, pareciam um punhado de demônios revoltados na sua impotência contra o
impassível gigante que os contemplava com desprezo, imperturbável a todos os
golpes e a todos os tiros que lhe desfechavam no dorso, deixando sem um gemido
que lhe abrissem as entranhas de granito. O membrudo cavouqueiro3
havia chegado à fralda4 do orgulhoso monstro de pedra; tinha-o cara
a cara, mediu-o de alto a baixo, arrogante, num desafio surdo.
A
pedreira mostrava nesse ponto de vista o seu lado mais imponente. Descomposta,
com o escalavrado5 flanco exposto ao sol, erguia-se altaneira e
desassombrada, afrontando o céu, muito íngreme, lisa, escaldante e cheia de
cordas que mesquinhamente lhe escorriam pela ciclópica6 nudez com um efeito de
teias de aranha. Em certos lugares, muito alto do chão, lhe haviam espetado
alfinetes de ferro, amparando, sobre um precipício, miseráveis tábuas que, vistas
cá de baixo, pareciam palitos, mas em cima das quais uns atrevidos pigmeus de
forma humana equilibravam-se, desfechando golpes de picareta contra o gigante.
O
cavouqueiro meneou a cabeça com ar de lástima. O seu gesto desaprovava todo
aquele serviço.
–
Veja lá! disse ele, apontando para certo ponto da rocha. Olhe para aquilo! Sua
gente tem ido às cegas no trabalho desta pedreira. Deviam atacá-la justamente
por aquele outro lado, para não contrariar os veios da pedra. Esta parte aqui é
toda granito, é a melhor! Pois olhe só o que eles têm tirado de lá – umas
lascas, uns calhaus7 que não servem para nada! É uma dor de coração
ver estragar assim uma peça tão boa! Agora o que hão de fazer dessa cascalhada
que aí está senão macacos8? E brada aos céus, creia! ter pedra desta
ordem para empregá-la em macacos!
O
vendeiro escutava-o em silêncio, apertando os beiços, aborrecido com a ideia
daquele prejuízo.
Aluísio Azevedo
O cortiço. São Paulo: Ática, 2009.
Vocabulário:
1 lajedos - pedras
2 picão, escopro, macete -
instrumentos de trabalho
3 cavouqueiro - aquele que
trabalha em minas e pedreiras
4 fralda - parte inferior
5 escalavrado - golpeado,
esfolado
6 ciclópica - colossal,
gigantesca
7 calhaus - pedras soltas
8 macacos - paralelepípedos
7.
(Uerj) “pareciam um punhado de demônios revoltados
na sua impotência contra o impassível gigante que os contemplava com
desprezo, imperturbável a todos os golpes e a todos os tiros que lhe
desfechavam no dorso”, (2º parágrafo)
Para caracterizar a pedreira, o narrador
utiliza várias vezes uma determinada figura de linguagem, como no trecho
sublinhado acima.
Identifique essa figura de linguagem e um de
seus efeitos estilísticos. Transcreva, em seguida, uma passagem do texto em que
a pedreira é descrita sob uma perspectiva diferente.
Resposta:
Trata-se de
personificação, prosopopeia ou animismo, recurso expressivo que atribui
predicados humanos a seres inanimados ou
irracionais. No texto, a pedreira é dotada de vida, um gigante em duelo com os
trabalhadores descritos como “uns atrevidos pigmeus de forma humana” que
desfechavam golpes de picareta contra ele. No entanto, a imperícia dos
trabalhadores provocava uma sensação de tristeza em Jerônimo que, como
cavouqueiro experiente, notava o desperdício na forma como trabalhavam e
extraíam as pedras (“Esta parte aqui é toda granito, é a melhor! Pois olhe só o
que eles têm tirado de lá – umas lascas, uns calhaus que não servem para
nada!”, “É uma dor de coração ver estragar assim uma peça tão boa!”,” E brada
aos céus, creia! ter pedra desta ordem para empregá-la em macacos”).
8.
(Uerj) Aqueles homens gotejantes de suor, bêbedos
de calor, desvairados de insolação, (2º parágrafo)
O enunciado acima apresenta uma sequência de
sensações.
Aponte o valor semântico dessa sequência e
identifique no texto outro exemplo em que a disposição das palavras produza
efeito similar.
Resposta:
A descrição enfatiza o trabalho árduo dos
homens que trabalhavam na pedreira, sujeitos ao calor e à sede. Em ordem
crescente, o autor usa a gradação em progressão semântica, para exprimir a
intensidade desse esforço. O mesmo recurso é utilizado imediatamente a seguir
para descrever as ações que provocavam essas sensações (“a quebrarem, a espicaçarem,
a torturarem a pedra”).
TEXTO PARA A
PRÓXIMA QUESTÃO:
O
sobrevivente
Impossível
compor um poema a essa altura da evolução da humanidade.
Impossível
escrever um poema – uma linha que seja – de verdadeira poesia.
O
último trovador morreu em 1914.
Tinha
um nome de que ninguém se lembra mais.
Há
máquinas terrivelmente complicadas para as necessidades mais simples.
Se
quer fumar um charuto aperte um botão.
Paletós
abotoam-se por eletricidade.
Amor
se faz pelo sem-fio.
Não
precisa estômago para digestão.
Um
sábio declarou a O Jornal que ainda falta
muito
para atingirmos um nível razoável de cultura.
Mas
até lá, felizmente, estarei morto.
Os
homens não melhoraram
e
matam-se como percevejos.
Os
percevejos heroicos renascem.
Inabitável,
o mundo é cada vez mais habitado.
E
se os olhos reaprendessem a chorar seria um segundo dilúvio.
(Desconfio
que escrevi um poema.)
CARLOS DRUMMOND
DE ANDRADE
Nova
reunião: 19 livros de poesia. Rio de Janeiro: José Olympio, 1985.
9.
(Uerj) Os dois primeiros versos enfatizam uma ideia
que será desconstruída pela leitura integral do poema, caracterizando uma
ironia, expressa também no título.
Transcreva o verso do texto que, em
comparação com os dois primeiros, revela essa ironia.
Em seguida, estabeleça a
relação entre o verso transcrito e o título.
Resposta:
A ironia está presente no último verso:
“(Desconfio que escrevi um poema)”. Esta afirmação colide com o que o eu lírico
expressa nos primeiros versos, em que nega a possibilidade de se fazer
verdadeira poesia perante os acontecimentos que oprimem o homem. Ao longo do
poema, o eu lírico questiona o mundo em que vive e expõe as sensações
conflitantes que concebe. O terceiro verso, “O último trovador morreu em 1914”,
alude ao início da Primeira Guerra Mundial e ao declínio de um fazer poético
que vai ter que ser substituído por outro e cujo padrão estético se adivinha
nas estrofes subsequentes. O uso
de "percevejos", de valor negativo, ao lado de "heroicos",
de valor positivo, compõe uma antítese que reforça semanticamente a ironia.
TEXTO PARA A
PRÓXIMA QUESTÃO:
TEXTO
1
“Saudações”
Ó ilustríssimos senhores
de modos finos, que saco!
Pelo amor da santa, fora
com vossos salamaleques!
Não quero louros nem busto
e nem meu nome em via
pública.
Não quero as vossas vênias
e rapapés, flores dúbias.
Não quero ser poeta
de que todos se orgulham.
Descaradamente confesso
a quem interessar possa:
Quero é ser a vergonha
da província e da república.
(Transpaixão)
TEXTO 2
“Lisbon revisited (1923)”
Não: não quero nada.
Já disse que não quero nada.
Não me venham com conclusões!
A única conclusão é morrer.
Não me tragam estéticas!
Não me falem em moral!
Tirem-me daqui a metafísica!
Não me apregoem sistemas completos, não me
enfileirem
conquistas
Das ciências (das ciências, Deus meu, das
ciências!) —
Das ciências, das artes, da civilização
moderna!
Que mal fiz eu aos deuses todos?
Se têm a verdade, guardem-a!
Sou um técnico, mas tenho técnica só dentro
da técnica.
Fora disso sou doido, com todo o direito a
sê-lo.
Com todo o direito a sê-lo, ouviram?
(Ficções do interlúdio)
10.
(Ufes) Considerando que intertextualidade implica a
“utilização de uma multiplicidade de textos ou de partes de textos
preexistentes de um ou mais autores, de que resulta a elaboração de um novo
texto literário” (Dicionário eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa),
justifique como esse processo ocorre na relação entre os trechos de
“Saudações”, do poeta brasileiro contemporâneo Waldo Motta, e de “Lisbon
revisited (1923)”, do poeta português modernista Fernando Pessoa.
Resposta:
Em ambos os poemas, o
eu-lírico evidencia a sua revolta aos bons-modos, às regras impostas pela
sociedade, aos critérios de comportamento e conduta que lhe são impostos: “Ó ilustríssimos senhores /
de modos finos, que saco!”, “Não quero ser poeta / de que todos se orgulham.” e
“Não me venham com conclusões!”, “Se têm a verdade, guardem-a!”.
Assim, temos dois poetas de
épocas distintas, cada qual com as suas peculiaridades, abordando um mesmo
assunto e de forma parecida: Álvaro de Campos, heterônimo de Fernando Pessoa,
do Modernismo português, um eterno descontente em conflito com o mundo; e Waldo
Motta, poeta brasileiro contemporâneo.
Resumindo, podemos dizer
que a revolta perante uma sociedade de aparências, com valores éticos e morais
questionáveis para o eu-lírico de cada um dos poemas, e a linguagem
exclamativa, irônica e, até mesmo, agressiva são os elementos que promovem o
diálogo entre os textos, a intertextualidade.
Links para questões de outras disciplina:
http://araoalves.blogspot.com.br/2013/03/questoes-discusivas-com-gabarito.html
Bons estudos!
http://araoalves.blogspot.com.br/2013/03/questoes-discusivas-com-gabarito.html
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